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Supremo não deveria incentivar censura na internet

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Foto: reprodução

Julgamento do Marco Civil tende a invadir seara do Congresso, em novo passo para cercear liberdade de expressão no país

Por Folha de S. Paulo

O Supremo Tribunal Federal prepara-se para mais uma invasão das competências do Congresso Nacional. Desta vez o alvo específico são dispositivos do Marco Civil da Internet, mas a mira geral aponta para a liberdade de expressão.

Consta da pauta desta quarta-feira (4) da corte a sequência do julgamento de ações que questionam fundamentalmente o artigo 19 da lei, promulgada em 2014, que estabeleceu as balizas para o funcionamento da rede mundial de computadores no Brasil.

O trecho em discussão do diploma assevera que provedores do serviço só poderão ser responsabilizados civilmente por conteúdo gerado por terceiros se descumprirem ordem judicial para tornar indisponível tal conteúdo.

Não há problema com esse comando se ele for avaliado pelo crivo clássico do Estado democrático de Direito. Proibir alguém de se expressar configura sanção tão drástica a um direito fundamental que ela deveria ser exercida, ainda assim em casos excepcionalíssimos, apenas pela caneta de uma autoridade do Judiciário.

O artigo 19 do Marco Civil nem precisaria disso, mas toma o cuidado de deixar explícito o seu propósito nas palavras introdutórias. Ele está na lei com “o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura”.

O espírito do tempo, no entanto, alterou esse entendimento inclusive no tribunal constitucional brasileiro, que num passado não tão remoto se portava como bastião da livre expressão no país.

Não mais. O ministro relator de uma das ações, Dias Toffoli, já indicou que ampliará os casos de responsabilização de provedores, pois segundo ele o sistema de punição deveria se ajustar ao modelo atual das redes, que incentivaria a difusão de inverdades e conteúdos odiosos e criminosos.

Será uma surpresa positiva se a maioria dos integrantes do Supremo contrariar a predisposição de Toffoli de impulsionar a autocensura nas empresas provedoras. A própria iniciativa do presidente Luís Roberto Barroso de colocar em pauta o julgamento demonstra a inclinação por dar mais um passo na direção da limitação do direito à expressão.

Os ministros pelo visto se cansaram de esperar que o Congresso Nacional, ao qual ainda cabe a função de legislar pela Constituição, decida sobre um projeto que trata desse assunto.

Então, ao mau hábito recente de interferir, por vias ortodoxas e heterodoxas, nas prerrogativas de expressão dos cidadãos, os supremos magistrados somaram um outro costume pernicioso, que têm adotado com frequência —o de meter-se em questões típicas de um outro Poder.

A saliência da cúpula do Judiciário brasileiro conota uma leitura equivocada da política. Há quase dois anos não subsiste mais a ameaça constante de um presidente da República autoritário, irresponsável e adversário da Carta de 1988. Os tempos são de normalidade institucional absoluta, e o Supremo já deveria ter-se recolhido a seu papel estrito.

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