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Raquel faz críticas ao PSDB e afirma: “Não sou oposição a Lula”

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Raquel e Lula

Por Matheus Lara / Estadão

Em meio a conversas para uma troca partidária num futuro próximo, a governadora de Pernambuco, Raquel Lyra (PSDB), em entrevista ao Estadão, fez elogios ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e destacou que, diferentemente da posição de sua sigla, não se coloca como oposição à gestão do petista. Apesar de ela ainda não ter batido martelo sobre a possível troca, tudo converge para uma filiação ao PSD de Gilberto Kassab, que hoje integra o governo federal.

Enquanto não toma uma decisão, porém, Lyra deixa clara sua divergência com o PSDB: “Discordo de posições que o partido vem tomando, como a oposição sistemática ao governo Lula. Não fomos oposição ao (ex-presidente) Jair Bolsonaro (PL), também acho que não deveríamos ser ao Lula, mas sim nos posicionarmos de maneira independente. Gastar energia com o que constrói”, afirmou.

Na conversa, Lyra faz acenos a Kassab, com quem diz ter construído “relação sólida”, e a sua base de prefeitos. A governadora comemora o resultado da eleição de aliados em 126 dos 184 municípios pernambucanos em outubro. “Sou municipalista por convicção”, disse.

No entorno da governadora, o trunfo eleitoral dos nomes indicados por ela nas eleições de 2024 é considerado crucial na construção de um projeto para 2026 e é visto como capital político robusto para justificar uma troca de partido. Para além de o PSD representar uma estrutura partidária melhor que a do PSDB, a leitura de aliados é de que, na possível disputa à reeleição, estar numa sigla da base de Lula poderia tensionar a esquerda no entorno de seu provável adversário, o prefeito reeleito de Recife, João Campos (PSB).

A governadora também falou sobre a PEC da Segurança Pública, defendida pelo governo federal e que sofre resistência nos Estados. “A proposta precisa ser mais discutida para que não afete a autonomia dos Estados e para que se alcance uma sintonia. Há neste momento um sombreamento de competências”, afirmou. Segundo ela, o assassinato de Antonio Vinicius Lopes Gritzbach, delator do PCC executado no aeroporto de Guarulhos na última sexta, 8, demonstra a urgência no combate ao crime organizado no País. “O Sistema Único de Segurança Pública traz benefícios, mas o que precisa ser feito é maior que isso.”

Confira a entrevista, na íntegra, da governadora ao Estadão

Em que pé estão as conversas para uma possível troca do PSDB pelo PSD?

Todo e qualquer anúncio sobre mim mesma, eu que faço. Sobre o PSDB, o que tenho a dizer é que fizemos o partido crescer (nas eleições 2024), construímos um partido forte, passamos de cinco para 32 prefeitos eleitos em quatro anos. Sou grata ao partido pela oportunidade de disputar e ganhar três eleições, mas faço discussões internas. Discordo de posições que o partido vem tomando, como a oposição sistemática ao governo Lula. Precisamos de unidade e consenso para que o Brasil possa enfrentar os desafios do combate à pobreza e das desigualdades regionais e para o crescimento sustentável. Não fomos oposição ao Bolsonaro, também acho que não deveríamos ser oposição ao Lula, mas sim de maneira independente nos posicionarmos sobre cada tema. É algo que tenho trazido sempre à discussão. Acho natural a especulação (sobre troca de partido), eu converso sim com muitos partidos, já recebi convites, mas o foco agora é cuidar do Estado e qualquer decisão será comunicada.

Pernambuco é o único Estado no Nordeste onde um partido de oposição ao governo Lula está no comando. A senhora, pessoalmente, então, não se coloca politicamente em oposição ao PT?

Não. Defendo a postura de independência. Vivemos um momento delicado no País e no mundo. Precisamos fazer do Brasil um país grande por sua estabilidade, segurança jurídica, economia verde, logística, como polo consumidor, como produtor de alimentos. O mundo ainda tem fome e precisamos construir esses consensos e ter uma agenda para o País. Por isso não me coloco como oposição ao presidente Lula.

A senhora chegou a conversar pessoalmente com Kassab sobre ir para o PSD?

Tenho uma relação muito sólida com Kassab e o PSD, relação que não foi construída agora. O presidente do PSD em Pernambuco, (deputado federal) André de Paula, é um grande parceiro da nossa gestão. Conseguimos fortalecer o partido na última eleição e temos conversado sempre, assim como temos conversado com lideranças de outros partidos. Mas coloco aqui que, sim, há uma proximidade forte com o Kassab e com o PSD.

O PSD está no governo federal e também em gestões estaduais de lideranças que fazem oposição ao governo Lula, como em São Paulo. O que pensa da atuação nacional do partido?

Prefiro que os próprios partidários comentem as estratégias do partido. Mas tenho respeito. Não só a Kassab, mas a muitas lideranças políticas que têm cargos de liderança, como a presidência do Senado (Rodrigo Pacheco), deputados federais, estaduais, senadores… Não cabe a mim fazer comentários sobre a estratégia do partido, mas aparentemente tem dado certo. Virou o maior partido do Brasil.

Seu atual partido, o PSDB, teve uma queda bastante drástica e perdeu muitas prefeituras se comparado a 2020, além de já ter perdido representação no Congresso há dois anos. Onde o partido errou?

O PSDB nasceu e cresceu forte com valores baseados na social-democracia e tem história. Essa história está registrada, com muitos governos e lideranças que contribuíram para o País. Mas o PSDB vive um momento de reflexão de necessidade de reencontro com suas origens e valores. As divergências internas são naturais, mas precisamos construir consensos em favor do Brasil e dos Estados. No meu Estado, 50% das pessoas estão nas condicionalidades do Bolsa Família. Temos mais Bolsa Família do que carteira assinada. É sobre a vida real das pessoas que precisamos discutir.

É neste sentido que a senhora considera que o partido faz oposição pela oposição?

É algo nesta linha, sim. Precisamos focar no que traz resultado e em como fazer o Brasil combater e superar a pobreza, gerar trabalho e garantir mais empreendedorismo e infraestrutura. O Nordeste carece de água, por exemplo. Em Pernambuco, 2 milhões de pessoas não têm acesso à água. Eu falo isso no Sudeste ou no Sul e parece inimaginável. Lá as pessoas passam duas horas sem água e já colocam isso com grande alarde, e é direito, mas nós não temos nem acesso ao básico. É sobre isso que precisamos falar todo dia, gastar energia com o que constrói.

A reação de tucanos no seu Estado a uma possível mudança de partido te preocupa? O PSDB é o partido com mais prefeitos eleitos e o presidente da Assembleia, Álvaro Porto, do seu partido, é um desafeto seu.

Álvaro é do PSDB, foi eleito comigo. Tivemos, sim, momentos de mais atrito, mas o que é importante dizer é que temos uma gestão baseada no diálogo. Todos os projetos de lei que mandei pra Assembleia Legislativa do Estado foram aprovados. Eu respeito o Poder Legislativo e trabalho para construir consensos. Recebemos o Estado com indicadores delicados do ponto de vista social e econômico, conseguimos organizar o caixa, buscando recursos e empréstimos com o governo federal e colocamos ritmo para fazer entregas. Esse movimento tem atraído os municípios e as pessoas. O resultado eleitoral foi muito significativo. Elegemos 126 prefeitos da nossa base, de 184 municípios no Estado, mas destaco que trabalhamos para todos os municípios. Sou uma municipalista por convicção. Os prefeitos comigo sabem que a gente garante prioridade no compartilhamento de responsabilidade junto com eles.

Politicamente, o que sinaliza para o seu grupo de aliados a vitória expressiva e em primeiro turno de João Campos em Recife?

Quando alguém é submetido à reeleição, a população julga seu mandato. Já passei por isso. 80% dos prefeitos dos municípios pernambucanos se reelegeram ou elegeram sucessor. Recife foi um deles. Vejo com tranquilidade. Ainda assim, e mesmo assim, independente do partido, nossa disposição no governo do Estado é trabalhar por todos.

Que recado as eleições de 2024 deram para os agentes da polarização no Brasil?

Quando a gente olha para o Brasil, os municípios querem saber quem tem condição de resolver sua vida, fugindo da polarização. Quem tem capacidade de união e de construção de soluções para os problemas das pessoas “invisíveis” ou marginalizadas pelo poder público. O recado que vem das urnas é que as pessoas afastam a polarização e estão em busca de quem tem capacidade de construir consensos, menos polarização, menos disputa e mais objetividade na entrega de resultados.

O cenário para 2026 por enquanto ainda segue bastante polarizado?

Sim, quando chegamos numa eleição que envolve Congresso, Presidência, claro que descola um pouco dos municípios e parte para um projeto de Brasil, de Estados. Penso eu que diante desse cenário haja ainda polarização, mas temos que lutar por quem luta por consensos.

Como tem sido seu contato e seu diálogo com o governo federal, em sua avaliação?

Me comprometi com o povo de Pernambuco que, independentemente de quem fosse presidente, eu estaria lá na primeira semana de governo para levar os temas do Estado. Tenho que reconhecer e agradecer a postura do presidente Lula e dos ministros para ajudar o Estado. Claro que montamos uma equipe qualificada e por isso também ganhamos confiança do governo. São mais de 600 ações do PAC em Pernambuco acontecendo, por exemplo. Pernambuco era campeão de obras paralisadas no Brasil e estamos enfrentando isso.

O presidente tem o grande desafio de aprovar orçamento e projetos para o fluxo de investimentos no País inteiro, garantindo infraestrutura, e a gente conseguir recursos para atender a população mais vulnerável e gerar oportunidades. O desafio é cavar orçamento para que essas ações possam acontecer. Existe essa agenda e agora é foco no trabalho.

O governo de Pernambuco vai enviar sugestões ao governo federal a respeito da PEC da Segurança Pública?

Temos feito observações. Importante dizer que Pernambuco está entre os Estados mais violentos do Brasil. Para enfrentar isso, criamos o Juntos Pela Segurança, onde reunimos todos os atores do sistema de justiça criminal para permitir a virada de chave. Estamos no sexto mês consecutivo com redução de homicídios e o crime contra o patrimônio cai desde o segundo mês do nosso governo. E virar a chave não envolveu a contratação de um novo policial militar ou civil sequer.

Do ponto de vista nacional, precisa haver concertação com o governo federal no combate ao crime organizado, nas fronteiras, no tráfico de drogas e de armas. Outra esfera é a mudança da lei processual penal para não haver desestímulo das forças de polícia, que às vezes não conseguem tirar de circulação quem não deveria estar convivendo em sociedade. Além disso, enfrentar temas como superlotação de presídios, construção de vagas nos sistema penitenciário e garantir o financiamento desses presídios.

Na sua leitura, a proposta do governo federal afeta a autonomia dos Estados?

A PEC precisa ser mais discutida. Há muito sombreamento de competências. Pode haver conflito de competência porque ela eleva a patamar constitucional leis ordinárias que, caso a caso, já geravam discussão sobre a quem cabia cada competência. É importante que esses temas sejam colocados na mesa antes de aprovar a PEC para haja consonância e para que não afete a autonomia dos Estados e consiga nos colocar em sintonia.

Como o caso de Guarulhos afeta a discussão sobre a PEC?

O assassinato em Guarulhos revela que não poder haver estratégia que não seja combater o crime organizado no País inteiro. Precisa haver, sim, a liderança do governo federal, precisa o sistema ser implementado, garantia de repasse de recursos com previsibilidade. O Sistema Único de Segurança Pública traz benefícios, o Fundo Nacional de Segurança Pública tem nos ajudado, mas o que precisa ser feito é maior que isso, desde a questão das fronteiras até o combate ao crime organizado com inteligência para investigar seu envolvimento com lavagem e dinheiro, algo que está exposto e escancarado nas apresentações preliminares que investigam a morte do delator em Guarulhos.

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