Por Magno Martins
Eu ainda morava em Brasília em 2000, ano que marcou a interrupção de um projeto de poder da chamada União por Pernambuco, liderada pelo então governador Jarbas Vasconcelos (MDB). O responsável pelo encurtamento do sonho era, na época, a maior liderança do PT no Nordeste em ascensão: o deputado estadual mais votado do Estado dois anos antes, nas eleições de 1998, de tradição operária, forjada na luta sindical pontuada por greves históricas, João Paulo e Silva.
Aquela eleição acompanhei boa parte em viagens periódicas ao Recife, cenário de uma disputa que despertou as atenções do País. Afinal, o que estava em jogo era a manutenção no poder de um grupo arregimentado numa aliança à direita por Jarbas Vasconcelos, já rompido com o mito Miguel Arraes, símbolo do esquerdismo em Pernambuco. Arraes e Jarbas combateram a ditadura, desafiaram os coronéis de patentes e sem patentes, urbanos e rurais, mas sempre numa relação de desconfiança.
Quando Arraes voltou do exílio no final dos anos 80, anistiado no bojo de um processo de reabertura lento, mas gradual, das liberdades democráticas no País, porteira aberta pelo ex-presidente Ernesto Geisel, encontrou seu campo de liderança ocupado por novas cepas de homens públicos, entre eles o próprio Jarbas e Marcos Freire, este o mais brilhante senador da história pernambucana. Tomou o lugar de Arraes na disputa pelo Governo do Estado nas eleições de 1982, mas perdeu, surpreendentemente, para Roberto Magalhães por causa de um fator casuístico, o voto vinculado.
O casuismo, que mudou de última hora as regras do jogo, obrigou o eleitor a votar em candidatos de um mesmo partido para todos os cargos em disputa, sob pena de anular seu voto. Alijado da disputa, Arraes assistiu de camarote à derrota do concorrente no mesmo campo ideológico e, quatro anos depois, voltou ao Palácio do Campo das Princesas pela porta que saiu deportado pelo regime de exceção. Foi protagonista de uma das eleições mais emocionantes do País. Esmagou nas urnas o hoje ex-ministro José Múcio Monteiro, na época um jovem político egresso da sua Rio Formoso, onde foi eleito prefeito, mas não tomou posse, para assumir a presidência da Celpe.
Arraes e Jarbas começaram a cortar o cordão umbilical em 1990. Candidato a governador numa disputa em que perdeu para Joaquim Francisco, candidato da direita moderna, Jarbas acabou traído por Arraes, que não aceitou disputar o Senado em sua chapa, montou uma chapinha para federal já filiado ao PSB e fez corpo mole na campanha. Oito anos depois, já abraçado com a direita numa aliança arquitetada pelo ex-deputado federal José Mendonça Bezerra, a chamada União por Pernambuco, Jarbas deu o troco a Arraes e o derrotou de forma acachapante.
Mas esta mesma aliança, liderada por Jarbas, não conseguiu manter, dois anos depois, nas eleições de 2000, a Prefeitura do Recife. Curioso, mergulhei nos bastidores daquela tumultuada eleição, na qual houve de tudo, de greve da PM com troca de tiros em frente ao Palácio a uma “banana” dada pelo prefeito e candidato à reeleição Roberto Magalhães. O resultado da longa pesquisa e apuração dos fatos resultou no livro “A derrota não anunciada”, reeditado nos últimos dias, em capítulos neste blog, como contribuição à história política de Pernambuco.
A repercussão é tamanha que os últimos livros, disponíveis nos sebos da cidade, foram esgotados depois da publicação dos primeiros capítulos. Daí, uma boa notícia aos interessados pela obra: será reeditada em edição virtual ainda neste primeiro semestre e, provavelmente, em papel também.