Por Mário Sabino / Metropóles
Quem acompanha este colunista, seja para concordar, discordar civilizadamente ou apenas xingar, sabe que venho dizendo, desde há algum tempo, que o PT pode virar o PSDB e fenecer como a Dama das Camélias.
A tísica do PT tem duas causas de fundo, para além das circunstâncias policiais, certamente muito definidoras também, apesar da limpeza de barras promovida pelo STF, como essa agora de José Dirceu.
A primeira das causas de fundo é o epílogo da carreira política de Lula, de quem o partido depende e para o qual não há substituto visível no horizonte (e não haverá).
A segunda causa é a ideologia caduca, peso morto que também afundou a esquerda em outras paragens. O ideário petista ou é a cartilha revolucionária ou é a cartilha assistencialista — que já teve muita utilidade eleitoral, antes de ser incorporada por todos os partidos e fundir-se à paisagem geral populista, assim como os cactos na caatinga.
Nenhuma dessas cartilhas jamais teve conexão com a realidade de um país que precisa superar os abismos profundos, do sanitário ao tecnológico, que o separam das nações civilizadas.
O desastre do PT nas eleições municipais foi ferroviário, mas não é de hoje que o partido perdeu arranque nas urnas. A eleição de Lula, em 2022, deve-se a circunstâncias muito particulares, digamos assim, e ainda assim ele venceu por margem estreitíssima Jair Bolsonaro, que resistiu a si próprio e ao apedrejamento da imprensa e do Judiciário.
Os jornalistas correram para tentar amenizar o impacto do desastre ferroviário do PT, apontando as análises para as derrotas dos candidatos bancados por Jair Bolsonaro. Mas há uma diferença e tanto entre um fato e outro. O PT, de esquerda, perdeu para a direita; Jair Bolsonaro, de direita, perdeu para a direita. Acho que não é preciso desenhar.
Temos agora um PT em tumulto, como se tivesse sido apanhado de surpresa pelo fracasso. A presidente do partido, Gleisi Hoffmann, está fula porque o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, disse que o PT, apesar de ter avançado em relação a 2020, “não saiu ainda do Z4 (zona de rebaixamento) que entrou em 2016 nas eleições municipais”. A presidente do partido acha que o ministro ofendeu o PT e o mandou trabalhar.
O bate-boca está no contexto da disputa não tão intestina assim das facções petistas pela próxima presidência do partido. Mas não há dúvida de que o PT está na zona de rebaixamento, para continuar no campo das ricas metáforas futebolísticas, tão ao gosto do partido e do seu chefe .
Os meus colegas de profissão acham que cumprem a sua função ao debater sobre o caminho que o PT deve seguir para não ter o mesmo destino do PSDB. Não acho que seja a nossa função, mas faço a minha contribuição: o partido deveria defender a diminuição do peso do Estado na economia, apoiar a livre-iniciativa, desideologizar escolas e universidades, estimular a meritocracia no serviço público, ter propostas rigorosas para a segurança pública, alinhar-se às aspirações da classe média e atenuar a agenda identitária. Mas aí o PT deixaria de existir tal como se constituiu e seria de direita, dirão alguns. Eis o meu ponto.