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O verde desce a serra. Ou será que sobe?

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Foto: reprodução

Por Geraldo Eugênio*

Semana passada a coluna tratou da expectativa das chuvas que estariam previstas e pediu à nossa irmã seca para adiar a visita ao Sertão. No primeiro caso, em se tratando de Serra Talhada, houve um adiamento curto de dois dias, chegando a tão esperada água dos céus no último domingo. Desde lá, todos os dias tem chovido. Em relação ao apelo à nossa parente, ainda não deixou claro o que ela fará nos próximos meses, mas vamos esperar que se entretenha em outras localidades e nos esqueça um pouco. Afinal ela já nos conhece tão bem que deixando de vir aqui por mais alguns anos não mudará sua percepção sobre nós da mesma forma que não a esqueceremos.

Neste mesmo horário, ao redor de oito  e meia da noite, há sete dias, o termômetro acusava uma temperatura de 34 oC, diminuindo um pouco somente a partir das onze da noite. Hoje, quarta-feira, quinze de janeiro de 2025, às oito e meia da noite, por incrível que pareça a temperatura registrada é de 23 oC. Em tal situação  até posso convidar os amigos que estavam aqui a retornarem. Mesmo de forma educada, não escondiam quão apavorados estavam com o calor. Aquela sensação que nós, sertanejos, conhecemos tão bem.

Lembro que há muito tempo, muito jovem, aproveitava as noites de verão para traçar algumas cervejas e discutir o futuro do mundo, inclusive do Brasil, em uma localidade onde vivi, um amigo gozador, testemunhando temperaturas superiores a 30 oC entre outubro e dezembro, no nosso improvisado bar, colocava a mão no paralelepípedo morno e conjeturou que talvez a tubulação do inferno passava por ali. Nunca acreditei nesta história por maior que pudesse ser a dose de pecados ao nosso redor.

Uma paisagem peculiar e encantadora

Nesta cidade que se constitui o centro estratégico do estado, apesar de que o centro geográfico ser Betânia, conta-se com um cenário incomum que lhe deu o nome, um promontório, ou serra que ao ser esculpida por milhares de anos apresenta um corte quase vertical que realça o corte ou  talhe. O aspecto desta serra varia ao longo do ano. Até o início de dezembro seu colorido era cinza amarronzado, onde se via a formação rochosa e o que restava da vegetação.

Logo após a chuva ocorrida no início de dezembro, este cenário se apresentava com um tom esverdeado com manchas de um amarelo pálido, significando que nem todas as plantas souberam aproveitar tão bem o pouco de água que foi colocado ao seu dispor. Hoje, tendo a oportunidade de observar cuidadosamente a serra, a partir das janelas do Sesc, me vinha a dúvida se o verde estava subindo ou descendo da serra. A verdade, meu amigo Francisco Mourato é que seja qualquer opção aceita, a serra está linda. Um pouco tempo à frente, ela tomará outras colorações, seja pelo florescimento da catingueira, das craibeira ou do marmeleiro, a verdade é que este desfile de cores nos é apresentado todos os anos.

Mudança mais do que bem vinda

Poder dormir sem o calor, não dando descanso ao corpo e ao cérebro, já é uma dádiva. Ser testemunha da mudança de humor entre os pássaros, roedores, anfíbios e, principalmente, dos insetos. As formigas ficam eufóricas. Avançam onde tem uma luz e até importuna pelo fato de serem atraídas incontrolavelmente pela luz amarela. Algumas espécies, liberam suas rainhas que saem em uma corrida transloucada à  procura de um buraco para formar uma nova família. É aí que milhares delas, na forma de tanajura, são coletadas se tornando uma iguaria para a culinária nordestina. Hoje pode-se quase dizer que uma lata de tanajura é vendida a preços superiores a qualquer outra mistura, seja um filé, ou bacalhau.

Há um outro fator extremamente importante para as famílias, das mais humildes às mais ricas, o decréscimo no consumo de energia, item que afeta à classe média mais do que a qualquer outro extrato social. É neste segmento que se encontram instalados o maior número de arcondicionados. É nele também que nem todas as residências contam com áreas passíveis de serem instalados sistemas de geração de energia solar, tendo que pagar a tarifa cheia durante os meses de verão, o que leva o valor da energia a se constituir em uma despesa pesada em seu orçamento. À medida que a temperatura arrefece, há um impacto forte em dois itens: energia e água potável, que também não deixa de ser uma outra despesa que pesa entre os consumidores de água engarrafada vendida como água mineral.

Voltando ao que sempre foi

No caso da agricultura, hoje acompanhando de João e da Agda, dois estudantes de Agronomia da UFRPE-UAST, fazendo um levantamento das sementes de milho e sorgo que iremos plantar a partir da próxima semana, como também dos insumos disponíveis, imaginava que este mesmo trabalho estaria sendo realizado em inúmeras propriedades rurais no semiárido. Não se pode ser afoito o suficiente para nas primeiras chuvas se plantar tudo o que estava planejado para o ano, ao mesmo tempo não dá para ver o trem passar e não aproveitar da melhor forma as águas que a natureza nos oferece.

São centenas de pesquisadores  e estudantes conduzindo seus trabalhos na área da agronomia e das ciências agrárias na região. Todas elas procurando encontrar uma forma de reduzir os riscos para as atividades agrícolas e pecuárias da região. Em se tratando da cultura do milho, especificamente, é importante sempre lembrar os avanços em manejo e produção nas últimas décadas. Com o trabalho que vem sendo desenvolvido com empresas privadas, haverá um momento em que materiais bem mais tolerantes ao estresse hídrico serão disponibilizados para plantio comercial em Pernambuco e no Nordeste como um todo. Não gostaria de nos ver distantes desta batalha. Importantes passos foram dados e outros tantos serão. O importante é não cair na percepção negativista de que o semiárido é uma região com pouca capacidade produtiva. O desafio é provar o contrário e é nesta linha de raciocínio que sigo. Apostando nos avanços tecnológicos e no conhecimento real a ser exercitado pelos milhares de jovens que estão concluindo seus cursos. Mãos à obra

*1Professor Titular da UFRPE-UAST

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