72,3% da população do Estado não tem acesso à rede coletora de esgoto, segundo informações do SNIS
Os baixos índices de coleta de esgoto é um grande problema para as cidades pernambucanas. Da periferia às orlas das praias. Do total da população do Estado, 72,3% não tem acesso à coleta, segundo dados do Serviço Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS). Ou seja, são 6,7 milhões de pessoas sem esse tipo de serviço no Estado.
A comerciante Claudine Ribeiro da Silva mora há 19 anos na Rua Presidente Kennedy, em Jaboatão dos Guararapes. A rua é asfaltada, mas em frente a sua casa passa uma canaleta, que deveria escoar a água da chuva. “A cidade foi crescendo e as casas e os conjuntos habitacionais dos bairros altos começaram a descarregar todo o esgoto nessa canaleta a céu aberto. Isso atrai insetos, ratos. Quando chove muito a água da chuva se mistura com o esgoto e entra dentro de casa”, conta.
A situação de Claudine se repete em várias cidades da Região Metropolitana do Recife. Com relação à coleta do esgoto, os municípios que apresentam as melhores coberturas são Recife, Olinda e Paulista. Ainda no Grande Recife, as cidades de Itapissuma, Araçoiaba, Goiana e Itamaracá aparecem como se 100% da população não tivessem acesso à coleta de esgoto, de acordo com o SNIS.
“Isso ocorreu com Goiana porque até 2017 não tinha uma pessoa que acompanhasse os índices de coleta de esgoto e água na gestão municipal. Por isso, esses dados não foram repassados”, resume a atual secretária de Urbanismo, Obras e Patrimônio Arquitetônico de Goiana, Isabella Soares. Ela acrescenta que a atual administração encarregou um funcionário de fazer esse acompanhamento. Como Goiana faz parte da RMR, estão previstas duas obras dentro do Programa Cidade Saneada, que vai implantar os primeiros sistemas de coleta na sede do município e em Ponta de Pedras. Essas obras vão significar um investimento de R$ 120 milhões para os primeiros sistemas de esgoto operados pela Compesa naquela cidade. As obras foram iniciadas em março e devem ser concluídas até 2022, de acordo com a estatal.
Situação parecida também está o Cabo, com mais de 90% da população sem acesso à coleta de esgoto. “Mas isso não significa que o esgoto corre a céu aberto para todo esse percentual da população. Usamos um dado do IBGE que indica que 50% da população do município dá ao esgoto um destino adequado”, explica a secretária de Planejamento e Meio Ambiente do município, Catarina Dourado. Dentro desse destino adequado estão as fossas construídas pelos próprios moradores. No Cabo, as praias de Enseada dos Corais e Gaibu recebem despejos de esgoto in natura. Segundo ela, o esgoto chega até a praia em galerias que deveriam transportar a água das chuvas porque os próprios moradores fizeram ligações clandestinas para o descarte do resíduo.
“A retirada dessas ligações clandestinas não é algo fácil. Temos feito fiscalizações ambientais, que inclui a notificação dos moradores e a autuação para minimizar o problema”, afirma Catarina. O Cabo está contratando um plano municipal de saneamento, que a própria secretária define como o primeiro passo para que o município passe a atuar de forma planejada com relação ao saneamento. A cidade é um das maiores da RMR, tem vários empreendimentos industriais e recebeu grandes investimentos no começo dos anos 2000, mas não alterou o sistema de saneamento.
A implantação de rede de esgotos é uma infraestrutura esquecida. “Isso ocorre na maioria das cidades do Nordeste. São cerca de 100 milhões de brasileiros sem acesso ao saneamento. É uma obra enterrada. Não dá voto. E a população não consegue ter uma percepção de quanto é vital e necessário ter um saneamento básico. De todas as infraestruturas de redes, a mais atrasada é a do saneamento básico”, afirma o consultor do Instituto Trata Brasil, Alceu Galvão. Ele defende que seja implantado um novo marco legal do saneamento para atrair investimentos das empresas privadas interessadas em prestar esse tipo de serviço, o que resultaria na melhoria dos atuais índices.
A falta de estrutura de saneamento repercute em outra questão básica: a saúde. Em Pernambuco, ocorreram 9.084 internações por doenças que podem ser transmitidas por água não tratada ou contaminada em 2017, último ano do levantamento do SNIS. E essas doenças foram responsáveis pela morte de 144 pessoas. “O saneamento é o controle mais eficaz para doenças relacionadas a insetos como filariose, dengue, chicungunha, zika”, cita o pesquisador do Instituto Ageu Magalhães da Fiocruz Recife André Monteiro.
Ele considera que muitas dessas doenças “não são aceitáveis” por aconteceram devido a um problema ambiental que inclui: o lixo em lugar inadequado, a baixa cobertura de coleta de esgoto e a intermitência no fornecimento da água. “A interrupção do serviço faz muitas pessoas armazenarem a água de uma forma inadequada e isso contribui para a proliferação de mosquitos, como o aedes aegypti. É uma tragédia uma criança ter microcefalia por causa de um problema ambiental”, resume. Ele estava se referindo ao fato de que a picada desse mosquito pode transmitir o vírus da zika, que está relacionado ao nascimento de bebês com microcefalia.
Em Pernambuco, a falta de água atinge 61,4% das residências, de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad-C) realizada pelo IBGE. Dos 9,4 milhões dos habitantes do Estado, 1,9 milhão – o que representa 20,9% – não tem acesso à água. A assessoria de imprensa da Compesa informa que atende 90% da população urbana do Estado com água e 25% da população urbana com esgotamento sanitário.
ESPERANÇA
Na RMR, a esperança para melhorar o índice de cobertura do esgoto está dentro de uma Parceria Público-Privada, o Cidade Saneada. Atualmente, a região tem uma cobertura de 37% na coleta de esgoto. Esse programa começou em 2013, quando esse percentual era de 30%. “A nossa intenção é chegar a 90% de cobertura nos 15 municípios da RMR até 2037”, afirma o diretor de Novos Negócios da Compesa, Ricardo Barreto. Em 2025, esse percentual deve alcançar 55% da população do Grande Recife.
Para melhorar esses índices, serão investidos um total de R$ 6,7 bilhões, sendo R$ 5,8 bilhões da BRK Ambiental – a parceira privada do Estado – e R$ 900 milhões da Compesa. Até agora, foram empregados R$ 850 milhões da BRK e R$ 130 milhões da Compesa.