Por Estadão
O secretário executivo do Ministério da Fazenda, Dario Durigan, sinalizou que o governo não vai desistir da proposta para reonerar a folha de pagamento. Segundo ele, o projeto de lei que prorrogou a desoneração é inconstitucional, antiorçamentário e antieconômico. A medida provisória (MP) editada pelo governo nos últimos dias de 2023, por sua vez, não foi uma afronta à vontade dos parlamentares, mas uma alternativa à judicialização.
“(A MP) é uma alternativa à judicialização. Judicializar era tudo ou nada, você vai para derrubar a medida do Congresso. O que nós estamos fazendo é dizer ‘vamos fazer algo que seja constitucional, que você corrige os problemas’”, afirmou Durigan, que concedeu a entrevista como ministro da Fazenda interino durante as férias do titular, Fernando Haddad.
A visão que Durigan manifestou sobre o tema é, no mínimo, peculiar. Para ele, editar uma medida provisória que vai frontalmente contra algo que a maioria do Congresso aprovou não é um agravo, mas uma tentativa de estabelecer um acordo prévio para evitar que o tema seja levado ao Supremo Tribunal Federal (STF). Porém, se ainda assim o Congresso devolver a MP sem analisá-la ou se vier a rejeitá-la, “por falta de opção”, o Executivo terá de apelar ao Judiciário para provar a inconstitucionalidade da política.
A tese do governo é a de que a medida é inconstitucional por estabelecer uma renúncia de receitas sem apresentar o impacto orçamentário nem prever medidas para compensar as perdas. Há interpretações divergentes, segundo as quais é preciso cumprir esses requisitos quando uma política é criada, mas não quando ela é prorrogada.
Independentemente do que venha a acontecer, tamanha obstinação com a reoneração da folha não tem nada que ver com apego à Constituição ou à lei. Na entrevista, Durigan deixou claro que, sem a reoneração da folha, o governo será obrigado a alterar a meta fiscal. “Todas as providências vão ser tomadas para a gente fechar o Orçamento. Se de fato o que nós estamos apresentando não vingar, não resta outra alternativa, aí você tem de mexer na meta”, disse o secretário executivo.
Já é consenso que o governo não conseguirá zerar o déficit neste ano e que a meta terá de ser alterada em março. Segundo o último Boletim Focus, o mercado espera um rombo equivalente a 0,80% do Produto Interno Bruto (PIB).
Para ter uma ideia, de janeiro a novembro do ano passado, as contas do setor público consolidado – que incluem União, Estados, municípios e estatais, exceto Petrobras e Eletrobras – registraram um saldo negativo de R$ 119,551 bilhões, segundo o Banco Central (BC). Para o Tesouro Nacional, o déficit de 2023 será de 1,32% do PIB; para o BC, ficará entre 1,6% e 1,7% do PIB; já a mediana das projeções do Boletim Focus passou para 2%.
Em quaisquer desses cenários, já seria difícil zerar esse rombo de um ano para o outro. Mas, se a ideia é apostar somente na recuperação de receitas e não mexer nas despesas, atingir esse objetivo se torna algo realmente impossível.
Assim, para não ter de admitir essa derrota mais que esperada e reconhecer que terá de mudar a meta, o Ministério da Fazenda decidiu culpar a desoneração da folha de pagamento – cujo impacto, segundo a própria pasta informou na exposição de motivos da medida provisória, será de R$ 12 bilhões neste ano.
É um valor considerável, mas longe de ser a única ou a principal razão pela qual o déficit zero não será atingido. As emendas parlamentares, por exemplo, somarão R$ 53 bilhões no Orçamento deste ano, e o fundão eleitoral terá R$ 4,9 bilhões para financiar as disputas municipais.
Não se vê, por parte do governo, mais do que um discurso vago e teórico em favor da qualidade dos gastos. Algumas das principais lideranças do PT atuam aberta e explicitamente contra toda e qualquer medida do ministro. Mas culpar a prorrogação da desoneração da folha de pagamento vai evitar que o ministro tenha de comprar uma briga que ele não tem como vencer com o presidente Lula da Silva. O roteiro para mudar a meta está pronto.