O governo Lula patrocinou trocas na cúpula da Petrobras após Magda Chambriard assumir a presidência da estatal, aumentando a influência do ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, e do chefe da Casa Civil, Rui Costa, na empresa. As nomeações ocorridas nos 100 primeiros dias de gestão Magda incluem pessoas de confiança dos ministros para tocar projetos estratégicos da companhia nas áreas de exploração, engenharia e transição energética.
Há ainda indicados no Conselho de Administração da estatal e em comitês de assessoramento do conselho, que forma a instância máxima de decisão da empresa, com cargos entregues a delegados de polícia, a irmã de um doador de campanha de Alexandre Silveira e assessores dos chefes das duas pastas.
O “condomínio” de nomeações que se formou na Petrobras conta também com indicados pelo PT do Rio e pela Federação Única dos Petroleiros (FUP), entidade sindical associada à CUT, também vinculada ao Partido dos Trabalhadores. O Estadão identificou 35 nomes ligados à legenda e a autoridades do governo.
Questionada sobre o aparelhamento em curso e as sucessivas trocas, a Petrobras disse que “a formação de equipes, com eventuais trocas de gestores, faz parte da dinâmica do processo de gestão”. A estatal informou que se manifestaria em nome dos executivos. O Ministério de Minas e Energia afirmou que a Petrobras “tem governança própria” e que a pasta não participou de indicações para cargos na gestão da petroleira, nem nos comitês de assessoramento (leia mais abaixo). A Casa Civil não se manifestou. “A FUP não faz indicações, nem precisaria”, afirmou o coordenador-geral da Federação dos Petroleiros, Deyvid Bacelar.
Três bancos de investimentos, que acompanham a Petrobras nos detalhes para informar seus clientes, avaliaram com ressalvas as mudanças na governança da empresa (leia mais abaixo).
Silveira e Rui Costa agiram pela troca de Jean Paul Prates por Magda Chambriard. A substituição ocorreu em maio deste ano, após um racha no governo envolvendo a distribuição de dividendos extraordinários da estatal. Prates foi demitido por Lula em uma reunião na presença de Silveira e Rui Costa. Na ocasião, ele classificou a demissão como “humilhante”.
As trocas começaram em abril no Conselho de Administração, pouco antes da chegada de Magda, que tomou posse no dia 24 de maio. Os indicados de Silveira são três de um total de 11 conselheiros. Rui Costa tem um indicado, e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, outro.
Em junho, Magda trocou três dos oito diretores. E, em julho, ocorreram substituições nos seis comitês de assessoramento ao conselho – esses grupos filtram as informações que chegam aos acionistas, são responsáveis pela peneira dos nomes indicados para a Petrobras e também auditam as despesas da empresa.
Em agosto, as trocas chegaram às gerências executivas, responsáveis pela operação da Petrobras no dia a dia. Foram 32 substituições em cargos na cúpula da empresa e nos comitês de assessoramento ao conselho no período de 100 dias.
As mudanças refletem a forma como Magda construiu apoios em Brasília. O nome dela, que se abrigou no PT do Rio durante o tempo em que o partido ficou fora do governo federal, foi levado à apreciação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva por meio de Rui Costa, ex-governador da Bahia.
A indicação de Magda recebeu a bênção dos também baianos Jaques Wagner, líder do governo no Senado, e José Sergio Gabrielli, que comandou a empresa sob Lula e Dilma. Ela também recebeu o apoio de João Vaccari Neto, ex-tesoureiro do PT egresso do Sindicato dos Bancários de São Paulo.
Não à toa, os grupos passaram a ocupar postos-chave. Rui Costa tem indicados no Conselho de Administração e na diretoria executiva, além do advogado-geral. A Previ (fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil), cujo presidente é do sindicato dos bancários de São Paulo, assumiu a área financeira da Petrobras. E o PT do Rio, junto com a FUP, os cargos operacionais na engenharia, na exploração e produção e na transição energética, área que deve concentrar 11% dos investimentos até 2028, cerca de US$ 11 bilhões (a preços de hoje, R$ 60 bilhões).
Ao ministro Alexandre Silveira, coube o domínio sobre o conselho de administração e os seus comitês de assessoramento. Esses grupos passaram a ser dominados por pessoas que não fazem parte da Petrobras e que são majoritariamente de Minas Gerais, o Estado natal do ministro, e próximas a ele.
Há oito pessoas diretamente ligadas a Silveira nos comitês de assessoramento da Petrobras, além dos que estão em outras repartições, como o conselho fiscal.
A delegada da Polícia Federal de Minas Gerais Cristina Bueno Camatta ficou com uma das vagas no conselho fiscal. O irmão dela, Gustavo Bueno Camatta, doou R$ 70 mil para a campanha de Silveira ao Senado em 2022.
O ministro também emplacou um colega de partido para presidir o comitê de investimentos, o advogado Benjamin Alves Rabello Filho, professor na Academia de Polícia Militar de Minas Gerais e ex-juiz do Tribunal Regional Eleitoral do Estado. Rabello Filho é filiado ao PSD, partido comandado por Silveira em Minas.
O secretário-executivo e número dois de Silveira no ministério, Arthur Cerqueira Valério, e o assessor de imprensa de Silveira, Raoni Pinheiro, também ganharam cargos nos comitês.
O aparelhamento da Petrobras pelo PT e por partidos aliados esteve na gênese do escândalo do petrolão – como foi apelidado o esquema de desvios montado dentro da Petrobras desbaratado pela Operação Lava Jato.
Mudança em comitê ocorreu no espaço de horas
Na reunião do conselho de administração do último dia 26 de julho, o avanço dos grupos políticos sobre os comitês de assessoramento provocou um conflito interno que terminou em mudança nas regras da companhia. A alteração foi feita em questão de horas, com o objetivo de acomodar os interesses dos aliados de Silveira.
Na ocasião, o presidente do conselho de administração, Pietro Mendes Adamo Sampaio, que é secretário de Petróleo e Gás no Ministério de Minas e Energia, tentou emplacar a troca simultânea em todos os seis comitês de assessoramento do conselho de administração.
No mais importante deles, o Comitê de Auditoria, a proposta era substituir Francisco Petros, representante dos acionistas minoritários, pelo candidato de Silveira, o advogado Fabio Veras, ex-conselheiro da Anatel no governo Jair Bolsonaro.