Funcionários públicos federais de mais de 20 categorias devem cruzar os braços na próxima terça-feira (18), em reivindicação à reposição das perdas inflacionárias. O movimento se acalorou após aceno do governo a algumas categorias do funcionalismo público, como a Polícia Federal, a Polícia Rodoviária Federal e o Departamento Penitenciário Nacional (Depen).
Os trabalhadores pretendem realizar atos em frente ao Banco Central a partir de 10 horas e no Bloco P do Ministério da Economia, a partir de 14 horas, em Brasília. Nas capitais, os protestos devem ocorrer de acordo com a mobilização local das entidades. Outras manifestações são esperadas para os dias 25 e 26. E, caso suas demandas não sejam atendidas pelo governo federal, os servidores prometem estender a greve por tempo indeterminado.
Entre os servidores que devem parar estão auditores da Receita Federal, funcionários do Banco Central, servidores da CVM (Comissão de Valores Mobiliários), auditores e técnicos da CGU (Controladoria-Geral da União) e do Tesouro Nacional, servidores da Susep (Superintendência de Seguros Privados), auditores do trabalho, oficiais de inteligência e servidores das agências de regulação.
Em protesto, os servidores também estão realizando a chamada “operação-padrão”, conhecida como “operação-tartaruga” – trata-se da realização dos serviços seguindo os procedimentos operacionais padrão com rigor excessivo.
Além disso, trabalhadores de algumas categorias também têm entregado seus cargos. Entre os funcionários da Receita, mais de 1,2 mil já entregaram seus postos comissionados. Auditores-fiscais da Receita Federal do Brasil, membros das cinco equipes regionais OEA (Operador Econômico Autorizado) e do Centro Nacional de Operadores Econômicos Autorizados (CeOEA), por exemplo, decidiram que, “enquanto não forem atendidas as justas reivindicações”, não farão nenhuma nova certificação OEA.
“As empresas OEA’s atualmente respondem por cerca de 25% do volume de importações e exportações nacionais. Entretanto, no presente momento, em função do absoluto desprezo com que são tratados pelo governo tanto os Auditores-fiscais quanto a própria Receita Federal, não restou alternativa aos auditores a não ser interromper provisoriamente as novas certificações, até que essa situação seja revertida. Os auditores estão cientes das enormes responsabilidades, da importância da categoria para o Estado e é chegada a hora de o governo também reconhecer os auditores-fiscais como se merece”, diz nota do Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal (Sindifisco).
Representante da categoria, Isac Falcão afirmou que a reunião recente com o ministro da Economia, Paulo Guedes, foi “frustrante” e não atendeu às expectativas dos servidores. “O movimento dos auditores fiscais, em decorrência da insensibilidade do governo às reivindicações da categoria, tende a intensificar”, disse.
“O ministro se manifestou no sentido de compreender o pleito, e achar justo, mas disse que não pode dar um prazo para a implementação do bônus de eficiência, que já se arrasta há cinco anos, sem regulamentação, e entende que esse não é o momento da solução dessas questões. Estamos na expectativa de que o movimento se acirre”, afirmou Falcão.
Rudinei Marques, presidente do Fórum Nacional Permanente de Carreiras Típicas de Estado (Fonacate), que representa cerca de 20% de todos os servidores federais, também afirma que o movimento deve se intensificar nas próximas semanas, “sobretudo se não houver uma repostas satisfatória do governo”.
“Queremos uma solução dialogada e esperamos que o governo abra imediatamente uma mesa de negociação para receber os nossos pedidos e dar respostas efetivas de quanto poderia ser essa recomposição linear”, disse à Gazeta do Povo.
O grupo acredita que há espaço no Orçamento da União para a recomposição salarial dos servidores, mesmo em meio ao contexto de cobertor curto. “O governo tem uma certa tranquilidade para conceder um reajuste linear e atender senão integralmente o nosso pedido de recomposição das perdas, ao menos parcialmente. E se não o fizer agora, só poderá ser feito em 2023 com validade para 2024. Mas seriam sete anos de congelamento, e nenhum trabalhador consegue viver com tamanha perda salarial”, diz o representante do Fonacate.
Segundo avaliação da União, o aumento de 1% linear a todos os servidores teria o potencial de gerar um impacto de R$ 3 bilhões no Orçamento. O Executivo reservou R$ 1,7 bilhão no Orçamento de 2022 para atender ao reajuste, espaço possível após a aprovação da PEC dos precatórios que, entre outras coisas, permite o parcelamento de parte dos R$ 89,1 bilhões em dívidas com decisão judicial definitiva, que a União tem com credores.
Promessa a funcionários públicos federais da área de segurança
O presidente Jair Bolsonaro (PL) vinha prometendo um reajuste às forças de segurança federais, exclusivamente, sob o argumento de que é “preciso valorizar” a categoria. A mudança atenderia apenas a Polícia Federal (PF), Polícia Rodoviária Federal (PRF) e ao Departamento Penitenciário Nacional (Depen), grupos considerados como base eleitoral do presidente.
No entanto, apesar de reconhecer que os servidores “perderam bastante poder aquisitivo” nos últimos anos, o presidente recuou da ideia. Em dezembro, após outras categorias reivindicarem reposição, Bolsonaro afirmou que o reajuste salarial não estava “garantido” para nenhuma categoria dos funcionários públicos federais.
“Primeiramente, não está garantido reajuste para ninguém. Tem uma reserva de R$ 2 bilhões, que você pode usar, poderia ser usado para PF (Polícia Federal), PRF (Polícia Rodoviária Federal), e também o pessoal do sistema prisional, mas não está nada garantido no tocante a isso aí. Alguns pegaram isso daqui e falaram: ‘Também quero’, e foi feita essa onda toda”, disse o chefe da República a jornalistas.
Em resposta, a categoria falou em “traição” por parte do presidente. “Caso o governo volte atrás e desista dessa reestruturação, a categoria poderá sentir isso como uma traição por parte do governo… Contudo, o momento é de crer que o governo Bolsonaro vai honrar com seu compromisso com o fortalecimento e a valorização da segurança pública”, disse Dovercino Neto, presidente da Federação Nacional dos Policiais Rodoviários Federais (Fenaprf).
Outro motivo que teria influenciado Bolsonaro a desistir da ideia é o recrudescimento da pandemia de Covid-19 no início de 2022 e, por consequência, o aumento da demanda por verbas públicas. O martelo ainda não foi batido, e servidores esperam uma resposta da União até o fim do mês. Enquanto isso, o governo federal também é pressionado pelo movimento de estados e municípios, que têm prometido e realizado aumentos salariais locais.
Procurada, a assessoria da FenaPRF afirmou que “entende como legítima toda manifestação de qualquer categoria do funcionalismo público em busca de melhores condições salariais e de trabalho”. “No entanto, é importante frisar que não estamos lutando por reajuste para os PRFs. O sistema sindical preza pelo respeito a todas as categorias, mas se foca na necessidade de fortalecimento institucional e na reestruturação da carreira dos profissionais da segurança pública. Há mais de uma década, a maior parte das carreiras típicas de estado tiveram este fortalecimento institucional, mas a PRF e as demais polícias da União foram deixadas para um segundo momento, como se a Segurança Pública não fosse igualmente essencial ao Estado e ao desenvolvimento da nação”, afirma nota enviada à reportagem.