Com cinco votos contra o orçamento secreto, o Supremo Tribunal Federal (STF) adiou a conclusão do julgamento sobre a constitucionalidade das emendas de relator, também chamadas de emendas de RP-9 e conhecidas como Orçamento Secreto. A postergação do fim da votação aconteceu após pedidos dos ministros Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes, últimos magistrados a se posicionarem. Até o momento, o placar conta com cinco votos contra a manutenção do orçamento secreto e quatro favoráveis. O primeiro ministro a votar nesta quinta-feira, 15, foi André Mendonça, que contrariou a posição da relatora da matéria, ministra Rosa Weber, presidente da Corte, e votou pela constitucionalidade. Mendonça negou que as emendas representem um “orçamento paralelo” e defendeu que trata-se da elaboração compartilhada ou mesmo orçamento participativo entre o Executivo, o Congresso e a sociedade. Na visão dele, reconhecendo problemas com a falta de transparência, o caminho mais adequado para a solução é “apontar parâmetros e critérios em consonância com o texto constitucional”. Por isso, ele propõe prazo de 60 dias para que o Congresso Nacional garanta às emendas de relator os mesmos níveis de transparência das emendas individuais e de bancadas. “Promover modificações a com finalidade de garantir as emendas de relator geral similar níveis para garantir transparência e publicidade nos ideais regulatórios nas emendas impositivas”, finaliza.
Na sequência, o ministro Kassio Nunes Marques seguiu o voto de Mendonça pela constitucionalidade da proposta. Para o magistrado, não é possível – ou corretor – separar o Parlamento do orçamento. “Orçamento público e Parlamento são ideias inseparáveis. Não se pode pensar no orçamento em seu sentido genuíno que não seja decorrente da aprovação parlamentar. Nem se pode cogitar um Parlamento sem poder sobre o Orçamento. Então, quando vemos partidos políticos minoritários virem ao STF para pedir a limitação dos poderes do Parlamento sobre o orçamento, devemos ter a maior prudência. A história mostra que quanto maior o poder do Legislativo sobre o orçamento, mais democrático o país”, exaltou Nunes Marques. Assim como Mendonça, o ministro Nunes Marques também admitiu que ajustes na transparência e publicidade devem ser realizados. Por isso, ele indica que, no prazo de 30 dias, sejam feitos ajustes das emendas do exercício de 2022 para que as “todas as demandas, independente, sejam associadas aos respectivos parlamentares e registradas em plataformas”.
O ministro Alexandre de Moraes e Dias Toffoli seguiram o entendimento e também se posicionou pela continuidade do orçamento secreto, ainda que tenham feito ressalvas. Em seu voto, Moraes destacou que “a população tem o direito de saber, o destino e o porquê indicou” os recursos, mas entendeu que as emendas não devem acabar. “Não porque concorde [com elas], mas porque acredito que o Congresso tem autonomia para legislar”, afirmou, defendendo também mais transparência. “O orçamento público deve ser utilizado de forma eficiente, devem haver prioridades e devemos ter critérios proporcionais. Não se justifica que determinado município de 10 mil habitantes tenha R$ 100 milhões em emendas. Ao mesmo tempo, sabemos que é um critério político, mas pode ser discricionário, não arbitrário. Deve ser fixado algum critério”, disse. Alexandre de Moraes defendeu que seja levada em consideração a proporcionalidade entre a maioria e minoria, contemplando também igualmente as bancadas. Ele também pediu que as emendas de relator sigam modelo de transparência e identificação como as emendas RP-6, também chamadas de emendas individuais.
O julgamento teve início nesta quarta-feira, 14, com voto de Rosa Weber pelo fim das emendas de relator. Ao longo da sua exposição de mais de três horas, a magistrada citou histórico de casos de corrupção orçamentária envolvendo o Congresso Nacional brasileiro, relembrando escândalos como o Caso PC Farias e os Anões do Orçamento, e ressaltou a “incapacidade” dos congressistas para identificar os autores das emendas e a destinação dos recursos, o que torna o atual modelo “incompatível com a ordem constitucional e republicana”, defendeu Weber, falando ainda em “balconização do orçamento”. “Por isso trata-se de um orçamento secreto, não se sabe quem são os parlamentares integrantes do grupo privilegiado, não se conhecem as quantias administradas individualmente, não existem critérios objetivos e claros para realização das despesas, tão pouco observam-se regras de transparência na sua execução”, pontuou a presidente da Corte. De acordo com ela, citando ofício apresentado pelos presidentes da Câmara e do Senado, Arthur Lira (PP) e Rodrigo Pacheco (PSD), apenas 70% dos deputados e 85% dos senadores deram transparência das despesas de emendas de relator, o que a ministra considera insuficiente. Segundo ela, foram identificados apenas R$ 10,9 bilhões dos R$ 36,9 bilhões desembolsados nos exercícios de 2021 e 2022. Ou seja, menos de um terço do valor total gasto.
Além de Weber, nesta quarta-feira, o ministro Edson Fachin também votou pela inconstitucionalidade do orçamento secreto. “As emendas do relator do orçamento, RP-9, não tem previsão na Constituição e não dependem, na sua prática, a esse conjunto de princípios e regras de natureza constitucional. A definição de agenda e a formulação de políticas públicas devem submeter-se democraticamente à vontade da maioria, descabendo utilização personalista, discricionária e aleatória de parcela do orçamento federal”, pontuou. Os ministros Luiz Fux, Cármen Lúcia e Luís Roberto Barroso também acompanharam voto da relatora pela inconstitucionalidade. Em sua exposição, Barroso disse que as emendas RP-9 retomam a prática do “toma lá, dá cá” na política brasileira. “Nem o Congresso deve ser subordinado ao presidente da República, nem o presidente refém do Congresso. Para evitar que o Congresso ficasse subordinado a caprichos do presidente é que se tornaram as emendas individuais e obrigatória impositivas, de modo que o presidente não pode mais barganhar apoio em troca de liberar ou não as verbas. Elas são impositivas e há virtude nisso. Por outro lado, não se pode tirar do presidente a possibilidade das escolhas ou de prestigiar a composição política. E presidente fraco é um risco democrático”, defendeu o ministro.