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Com o Brasil a beira do abismo, resta a Lula a carta fraudulenta da defesa da democracia contra o bolsonarismo

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Foto: Wilton Junior/Estadão

Editorial Estadão

O presidente Lula da Silva avisou formalmente seus auxiliares na primeira reunião ministerial do ano que todo o seu governo deve começar já a trabalhar por sua campanha à reeleição, em 2026. E o fez sem rodeios nem ambiguidades: “O que eu quero dizer para vocês é que 2026 já começou”.

A bem da verdade, Lula já está em campanha há muito tempo, mas agora é oficial – e, claro, tudo por culpa da oposição: “Pelos adversários, a eleição já começou. É só ver o que vocês assistem na internet para vocês perceberem que eles já estão em campanha”.

Como tudo o que envolve Lula, há obviamente um bocado de mistificação. O que o petista chama de “campanha eleitoral” da oposição nada mais é do que a exploração política dos inúmeros erros do governo, o que é a essência do embate democrático.

E Lula parece ter entendido que está perdendo esse embate – e de lavada. O já antológico caso da “taxação do Pix”, que humilhou o governo nas redes sociais e fora delas, é apenas o sintoma de problemas muito maiores, alguns dos quais diagnosticados pelo próprio presidente na reunião.

Não é só que, dois anos depois da posse, “a entrega que fizemos para o povo ainda não foi a entrega que nos comprometemos a fazer em 2022”, como disse Lula. A verdade é que o presidente a esta altura parece saber que não tem condições de “entregar” o que prometeu porque os compromissos fiscais assumidos pela equipe econômica, ainda que frouxos, limitam o uso da máquina do Estado para conquistar votos. A não ser que Lula resolva mandar às favas os escrúpulos fiscais, como já fez em seu mandato anterior, será difícil desfazer a sensação de impotência.

Sem o dinheiro farto da era de ouro do lulopetismo, duas décadas atrás, resta a Lula caprichar na propaganda, e foi por isso que transformou um marqueteiro profissional em um de seus principais ministros. Por mais competente que possa ser o referido marqueteiro, porém, não há como convencer os brasileiros de que a vida melhorou sob Lula quando os preços não param de subir, contrariando a famosa promessa de campanha petista segundo a qual o povo voltaria a comer picanha e tomar uma cervejinha. Lula parece saber disso e, na reunião, admitiu que “os alimentos estão caros” e que “é uma tarefa nossa fazer com que os alimentos cheguem baratos à mesa do trabalhador”. A julgar pelo que conhecemos do lulopetismo, a ordem cheira a intervenção do Estado na formação de preços, o que quase sempre resulta em desabastecimento e mais inflação.

O fato relevante, contudo, é que Lula parece ter entendido onde o calo está apertando. O presidente admitiu que ele e seu governo estão desconectados dos anseios da população. “O povo com que estamos trabalhando hoje não é o povo dos anos 1980, que queria ter emprego com carteira assinada. É um povo que está virando empreendedor e precisamos aprender a trabalhar com essa nova formação do povo brasileiro”, afirmou o petista.

Sabe-se lá o que Lula pretende fazer para que esses “empreendedores” deixem de vê-lo como o símbolo de um Estado glutão que cobra muito, entrega pouco, atrapalha bastante e está a serviço de castas e companheiros. Ninguém é bobo: quando Guilherme Boulos, candidato de Lula na recente eleição à Prefeitura de São Paulo, posou de amigo dos “empreendedores”, levou uma surra nas urnas. O mesmo provavelmente se dará com o próprio Lula: como disse o ideólogo petista André Singer em entrevista à BBC Brasil, “o PT não pode aderir a uma ideologia do empreendedorismo do salve-se quem puder”, porque “isso é contra seus próprios princípios” e “é contra aquilo que ele veio propor para a sociedade brasileira”. Ou seja, a adesão do lulopetismo ao empreendedorismo vale tanto quanto uma nota de três reais, e não há ministro-marqueteiro que mude isso.

Diante desse cenário, resta a Lula a carta fraudulenta da defesa da democracia contra o bolsonarismo. O petista deixou isso claro na reunião: “Precisamos dizer em alto e bom som, queremos eleger governo para continuar o processo democrático do País, não queremos entregar esse país de volta ao neofascismo, neonazismo, autoritarismo”. Soa como desespero, mas é só o velho Lula de sempre.

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