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BC vê rombo nas contas R$ 40 bilhões maior que governo Lula; economistas apontam perda de credibilidade

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Ministros Fernando Haddad (Fazenda) e Simone Tebet (Planejamento e Orçamento) / Foto: Diogo Zacarias/Ministério da Fazenda

Diferença entre déficit público calculado pelo Banco Central e o apurado pela pasta, no acumulado em 12 meses até julho, é a maior da história; Tesouro não se manifestou

Por Estadão

O projeto da desoneração da folha de pagamentos, aprovado pelo Congresso com o aval do governo, reforça as divergências entre Banco Central e Ministério da Fazenda sobre o tamanho do rombo fiscal. Num cenário já marcado pela incerteza com o rumo das contas públicas, especialistas alertam para a perda de transparência e credibilidade em relação ao resultado primário do País – que leva em conta o saldo entre receitas e despesas e serve de parâmetro para a verificação da meta fiscal.

texto da desoneração, que ainda aguarda a sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), permite que o Tesouro Nacional contabilize como receita primária – ou seja, computada para a meta – os valores esquecidos por pessoas físicas e jurídicas em contas de instituições financeiras, como bancos, corretoras e cooperativas. Serão R$ 8,6 bilhões a mais no cofre do governo, um valor que não será considerado pelo BC no seu cálculo de resultado primário. Pelo arcabouço fiscal, porém, a verificação da meta é atribuição do Banco Central.

BC e Tesouro sempre tiveram metodologias distintas para aferir esse resultado. A grande questão é que essa diferença deixou de ser residual e se aprofundou. No acumulado em 12 meses até julho, o rombo calculado pelo BC é superior em R$ 39,7 bilhões ao verificado pela Fazenda. Em valores corrigidos pela inflação, essa discrepância chega a R$ 41,1 bilhões – a maior diferença da história, segundo levantamento do economista-chefe da Tullett Prebon Brasil, Fernando Montero. Procurado, o Tesouro não se manifestou.

Boa parte dessa divergência é explicada pelos R$ 26 bilhões deixados por trabalhadores nas cotas do PIS/Pasep, os quais foram incorporados pelo Tesouro em setembro do ano passado.

Na ocasião, o governo contabilizou essa cifra no resultado primário, melhorando o dado fiscal de 2023. Isso ocorreu com o respaldo do Congresso, por meio da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Transição, aprovada no fim de 2022. Esses valores, no entanto, não foram computados como receita primária pelo BC, levando a uma diferença expressiva nos números apurados pelos dois órgãos.

A diferença de quase R$ 40 bilhões ainda inclui cerca de R$ 8 bilhões de ajuste metodológico em relação às compensações aos Estados pela redução do Imposto sobre Circulação de Mercadoria e Serviços (ICMS) e discrepâncias estatísticas mensais – que sempre existiram..

“Cria um problema grande de apuração (da meta) e de credibilidade sobre o conjunto de regras fiscais que a gente tem”, diz Gabriel Barros, economista-chefe da ARX Investimentos e ex-diretor da Instituição Fiscal Independente (IFI), órgão atrelado ao Senado Federal.

O resultado primário é apurado com base na diferença entre receitas e despesas, sem considerar os juros da dívida pública. Ou seja, é o número que determina se o governo fechou o ano no azul ou no vermelho e se cumpriu ou não a meta estabelecida pela equipe econômica.

“O (resultado) primário serve para avaliar como está sendo o desempenho da administração pública para conseguir reduzir a sua dívida a partir da política fiscal, se (ela) está sendo expansionista demais, contracionista demais, se está investindo nos lugares certos”, ressalta João Pedro Leme, analista da consultoria Tendências.

Mais do que reforçar a incerteza em relação às contas públicas, o que chama a atenção dos analistas é que a Fazenda, ao sustentar o seu número de primário, vai na contramão do que diz a lei do arcabouço fiscal, de que o cálculo da meta é de responsabilidade do BC. Isso, avaliam os especialistas, pode trazer o Tribunal de Contas da União (TCU) para o centro do debate, com o objetivo de arbitrar a questão.

“Fica uma dúvida gigante. Ninguém sabe como vai ser apurado (o resultado primário). Certamente, o TCU vai ter de entrar na jogada. Criaram um imbróglio jurídico, de como vai ser feita a apuração. O arcabouço diz claramente que o cumprimento é feito pelo dado divulgado pelo BC”, afirma Barros.

Questionado pelo Estadão, o TCU informou que ainda não “examinou formalmente” a aprovação do projeto de lei da desoneração, mas ponderou que a questão “poderá ser analisada futuramente, seja por provocação ou por iniciativa do tribunal durante os trabalhos de acompanhamento da gestão fiscal”.

A corte diz, ainda, que se preocupa em garantir não apenas o cumprimento da legislação vigente, “mas também a adoção das boas práticas de contabilidade pública e de estatísticas fiscais, conforme padrões internacionalmente aceitos”. E que, caso necessário, adotará os procedimentos para informar a questão ao Congresso Nacional e ao Poder Executivo.

Com o transcorrer dos meses, o valor de R$ 26,6 bilhões originário do Pis/Pasep sairá do montante acumulado em 12 meses, uma vez que foi computado em setembro passado, e a discrepância entre Tesouro e BC tende a diminuir. Novos valores, porém, devem voltar a elevar essa diferença, como é o caso dos recursos esquecidos nas instituições financeiras.

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