Por Carlos Andreazza / Estadão
Luís Roberto Barroso teve artigo autoelogioso publicado neste jornal. Já ao segundo parágrafo informado o leitor de que o juiz se desacostumou do mundo em que a liberdade de expressão não o lisonjeie, habituado ao conforto daquele em que tudo quanto o desgostar será raivoso.
Para que se avalie a realidade em que o texto foi produzido, uma afirmação se impõe: “somos o tribunal mais transparente do mundo”. Barroso – palestrante em eventos de empresas com interesses no Supremo – mereceria uma nota de comunidade.
Merecerá, antes, gratidão. Ao escrever que “é possível não gostar da Constituição e do papel que ela reservou para o STF”, iluminou o cronista. Barroso, um inconformado, não gosta da Constituição.
Daí seu artigo trazer palavra nenhuma acerca do monocratismo por meio do qual seus pares têm se constituído até em líderes de governo, as jurisprudências aos ventos influentes das ocasiões. Omitiu-se. Em sua defesa: omissão – a Parlamentar sobretudo, doutor – é posição politicamente legítima. Criticar togado que usurpe poder alheio – por virtuosa que lhe seja a intenção, por linda que for a Lei cultivada à cabeça –, obrigação do jornalismo.
A louvação a si confirma que o Supremo renunciou ao comedimento. Peça pretendida como em defesa do STF e do próprio autor – uma das estrelas do tribunal personalista desde o qual Xandão, o nosso novo herói, saiu da lâmpada. Na prática, texto intimidatório – natureza que o ministro talvez nem seja capaz de perceber, tal o déficit de república na corte que preside.
Corte que, sob o corpo onipresente e infinito dos inquéritos xandônicos, já censurou o jornalismo. Em defesa da democracia.
Barroso, autoritariamente distraído, conta o número de editoriais em que o Estadão criticou o Supremo no ano passado. Dirá, a seguir, que o Brasil “é o país que ostenta o maior grau de judicialização do mundo, o que revela a confiança que a população tem na Justiça.”
A maioria dos editoriais em que o jornal foi duro com o STF teve como objeto um inquérito estabelecido de ofício, sem qualquer provocação e sem objeto definido – o que só revela a confiança de um ministro no outro.
É vergonhoso que juiz dessa corte constitucional – e logo o do “nós derrotamos o bolsonarismo” – insinue que publicação sesquicentenária contribua “para ambiente de ódio institucional”.
Barroso – o do “perdeu, mané!” – se tem na conta de um dos nossos salvadores. Pelo que lhe deveríamos a gratidão acrítica eterna. Vive no 8 de janeiro permanente e cultiva esse estado de vigília paralisante. No curso da leitura de sua autocongratulação nunca falta a entrelinha ameaçadora: se me – nos – criticar, o capeta volta e o golpe vem. Aqui não cola.