Por Paulo Pozonoff Jr. / Gazeta do Povo
O cantor e compositor Caetano Veloso foi alvo de um mandado de busca e apreensão na manhã deste sábado (21). A mando do ministro Alexandre de Moraes, a polícia bateu na porta do artista às 6h da manhã e saiu de lá com celulares, computadores e até mesmo um livro de poemas do Maiakovski. Caetano Veloso é investigado por atentar contra a democracia. Nos últimos meses, o cantor disseminou ideias stalinistas sob influência do ideólogo Jones Manoel.
Em seu despacho, o ministro Alexandre de Moraes destacou a importância de se conter “elementos retrógrados que pregam um regime assassino e reconhecidamente responsável pela morte de milhões de pessoas – um verdadeiro genocídio”. Ele disse ainda que o país não pode “testemunhar inerte aos recorrentes pedidos para que seja instaurada no país uma Ditadura do Proletariado”.
Não é de hoje que movimentos de extrema-esquerda pregam o fim das instituições democráticas e participam de atos que promovem a ruptura institucional no Brasil. Em abril de 2016, por exemplo, a ex-presidente Dilma Rousseff recebeu no Palácio do Planalto a organização terrorista MST, que luta contra o fim da propriedade privada e propõe uma espécie de ditadura do campesinato. Na ocasião, os manifestantes ameaçaram a nação com mais invasões de terra e violência no campo.
A recente manifestação esquerdista, progressista e petista de julho de 2021 também aponta para uma escalada retórica da esquerda. No Rio de Janeiro, fascistas que se dizem antifascistas chegaram até a hastear uma imagem do ditador sanguinário Getúlio Vargas, herdeiro moral de Mussolini. Leonel Brizola, segundo especialistas o principal responsável por transformar o Rio de Janeiro no paraíso do crime que é hoje, também foi homenageado.
Caetano Veloso é um notório agitador político desde sua longínqua juventude. Naquela época, contudo, o cantor e compositor foi confundido com um libertário ao dizer que “é proibido proibir” – slogan que, à época, não foi bem-recebido pela cúpula do Partido Comunista Brasileiro, cujo lema era justamente “proibir, sim, mas é para o seu bem”. Depois de algum tempo alheio à política e dedicado apenas a aterrorizar a música popular brasileira com versões de Bob Dylan, Nirvana e Joni Mitchell, nos últimos meses Caetano Veloso, o Caê, voltou a chamar a atenção por sua adesão tardia ao stalinismo.
“O stalinismo é lindo”
“O stalinismo é lindo”, disse ele, com seu inconfundível sotaque baiano. “Ou não”, acrescentou. Quando confrontado com o caráter assassino e genocida do Joseph Stalin, Caê disse simplesmente que “Bolsonaro é muito pior e ninguém diz nada”.
No momento da operação, Caetano Veloso tomava café na sacada de seu apartamento de frente para o mar, no Arpoador. Ele abriu a porta para os policiais, convidou-os a entrar e até pegou o violão para cantar “Circuladô de Fulô” às autoridades. Sob ameaça de prisão por desacato, contudo, Caê desistiu da cantoria e se dedicou a reclamar da violação de suas liberdades individuais. “Mas o que foi que eu fiz de errado?”, perguntou ele a este repórter.
A pergunta foi reverberada por centenas de milhares de intelectuais de esquerda. “O direito à manifestação é assegurado no Brasil. Além disso, a manifestação nem ocorreu ainda. Como o ministro pode ter tanta certeza de que haverá gente lá defendendo a Ditadura do Proletariado?”, perguntou o jurista Marcos Camacho, o dr. Marcola.
Entidades de defesa da liberdade de expressão, como a OAB, CNBB, TJLP e IGPM lançaram notas de repúdio. “O Estado Democrático de Direito tem meios de garantir a democracia e proteger a honra das instituições e dos homens e mulheres que as compõem. Não é prendendo deputado ou coagindo artistas que o STF conseguirá recuperar a sua reputação de guardião da Constituição”, lê-se numa dessas notas.
O silêncio do STF diante das arbitrariedades do ministro Alexandre de Moraes foi quebrado por seu colega, o ministro Luís Roberto Barroso, também ele um valente guardião da democracia, da Constituição, do Estado Democrático de Direito e da honra da Suprema Corte do Meu Brasil Varonil. Em entrevista recente, Barroso chamou para si a responsabilidade de definir o que se pode ou não dizer no debate público.
No discurso, o ministro (que às vezes faz bico como ator político) disse que “mentira deliberada [como esta crônica], ódio, teorias conspiratórias [alô, Foro de São Paulo!] e difusão de desinformação incentivando agressões, incentivando posições anticientíficas que levam à morte de pessoas, isso não é protegido pela liberdade de expressão”.
Sobre isso, e numa reviravolta digna de livro ruim, o ideólogo Jones Manoel não hesitou em aplaudir as palavras de Barroso, bem como a operação de busca e apreensão no apartamento de Caê. “Titio Stalin não faria melhor”, disse.
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* É quase uma confissão de derrota ter de dizer isso, mas digo mesmo assim: este texto é uma obra de ficção. Qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência.