Sequência de fatos negativos derrubam estimativas do PIB de 2021 para abaixo de 3% ante previsão de avanço na casa de 3,5% no fim do ano passado
O ano de 2021 iniciou com a promessa de recuperação da economia brasileira depois da crise sem precedentes causada pela pandemia do novo coronavírus. Se o otimismo era pautado na retomada das atividades econômicas a partir da imunização da população, o noticiário recente jogou um balde de água fria, e analistas já começam a refazer os cálculos para um crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) mais tímido do que o esperado. Economistas e entidades consultadas pelo Banco Central estimaram crescimento de 3,45% neste ano, segundo o Boletim Focus divulgado nesta segunda-feira, 18. Os dados, porém, foram coletados na sexta-feira anterior, 15 de janeiro, e ainda não levavam em consideração a onda de notícias ruins que seguiu ao longo desta semana. A disparada do número de infecções, quando se esperava justamente o contrário, é o principal fator para a quebra da euforia. As tão necessárias vacinas vieram, mas em uma quantidade ínfima diante da urgência do país, e o aumento dos estoques no curto prazo parece pouco crível diante dos entraves entre os governos brasileiro e chinês para a importação de insumos para a fabricação de imunizantes em território nacional. Para piorar, o velho fantasma do descontrole dos gastos públicos voltou a assombrar o país depois que os dois candidatos governistas na disputa pelo controle da Câmara e Senado se mostraram favoráveis ao retorno do auxílio emergencial.
A soma de fatores desfavoráveis levou a consultoria Tendências rebaixar a previsão do PIB para 2,9% — há pouco mais de um mês, a expectativa da casa era de 3,5%. Maílson da Nóbrega, sócio da empresa e ex-ministro da Fazenda, aponta que o prolongamento da crise para além do esperado foi o principal fator para o esvaziamento do índice. O tombo, porém, pode levar o crescimento econômico para 2,5%, já que ainda não traz em consideração as novas medidas de isolamento social anunciadas pelo estado de São Paulo nesta sexta-feira, 22, diante de novos picos de infecções e óbitos. A frustração com a falta de sintonia entre autoridades do país e da China na importação do Ingrediente Farmacêutico Ativo (IFA), como é chamada matéria-prima necessária para o desenvolvimento dos imunizantes dentro do Brasil, também não estava no radar da Tendências. “Enquanto o país não tiver a própria produção de insumos, não tem como desenhar cenários seguros. Estamos em uma disputa mundial pela vacina, somente a China tem mais de 1 bilhão de pessoas para imunizar. Não se sabe até que ponto eles vão continuar suprindo os outros. São incertezas que levarão tempo para ser esclarecidas”, afirma. Carlos Kawall, diretor da ASA Investments e ex-secretário do Tesouro Nacional, também estima o PIB para 2021 abaixo do consenso do mercado, com alta de 2,4%. O número também é justificado pela continuidade dos efeitos da Covid-19 na economia nacional e ficam ainda mais pressionados com a demora do governo em acertar o passo para a imunização ampla e contínua. “Há previsões de casas respeitáveis de crescimento maior até do que 4%. A nossa percepção é que essas previsões mais otimistas vão ser ajustadas ao longo dos próximos meses, a não ser que haja uma reviravolta muito grande nos números da pandemia, alem da mudança do ritmo de vacinação”, afirma.
A crise sanitária e a falta de coordenação na busca por soluções para montar uma campanha de vacinação robusta não são os únicos pontos que afundam as estimativas. O risco fiscal voltou ao radar nesta semana, após declarações dos candidatos ao comando do Congresso apoiados pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Em conversa com empresários na quinta-feira, 21, o deputado federal Arthur Lira (PP-AL) afirmou que seria possível o aporte extra entre R$ 20 bilhões a R$ 50 bilhões por mais seis meses para cobrir o custo de novos benefícios sociais. Mais comedido, o senador Rodrigo Pacheco (DEM-MG) foi na mesma linha e disse que o quadro de pandemia demanda assistência do governo. As declarações se tornaram veneno aos olhos do mercado, que já começou a cogitar o rompimento do teto de gastos e a disparada dos gastos públicos. Como resultado, o dólar avançou 2,14% nesta sexta-feira, 22, fechando a R$ 5,48. Ao mesmo tempo, o Ibovespa derreteu para a casa dos 117 mil pontos, o nível mais baixo desde o fim de dezembro. “Dependendo da eleição deles e de como irão se comportar, podem surgir as ‘pautas-bombas’ que criam ameaças ao teto, e aí morremos todos. Se houver a percepção de flexibilização, vamos para um cenário muito ruim, com fuga de capital, dólar aumentando, inflação alta. Pode abortar todo o processo de recuperação em curso”, afirma Maílson da Nóbrega. (Por Rádio Jovem Pan)