Apostas são tendência entre fãs de esportes; prática se aproveita de uma brecha na lei, que não regulamenta atividade no País e movimentam cerca de R$ 4 bilhões por ano
Vínícius Barros / Filipe Ribeiro/JC Imagem
Bola ao centro, times prontos e uma série de pessoas vidradas para acompanhar o resultado. Poderia ser um enredo de qualquer partida de futebol, mas a ávida legião que assiste ao jogo atende por outro nome: apostadores.
Febre no Brasil, as apostas esportivas movimentam cerca de R$ 4 bilhões por ano no País, de acordo com especialistas. Dinheiro, cartão de crédito ou débito, boleto bancário e até moeda eletrônica. Você escolhe. Nesse mundo, o grande produto é justamente quem aposta, imerso nos quase 500 sites estrangeiros, dos quais cerca de 10% são traduzidos para o português. Eles operam livremente no Brasil por terem servidores hospedados em outros países, não sendo submetidos à Constituição nacional. Isso faz com que essa atividade drible a lei brasileira, sem sofrer nenhuma marcação.
No Recife, as apostas despertam não só a curiosidade, mas também a paixão dos torcedores. Unir o fanatismo com a chance de ganhar um dinheiro extra enche os olhos de muitos, mas também pode esvaziar os bolsos. Este é o caso de Luiz Carlos, jogador de futebol profissional, no momento sem clube, que já chegou a perder R$ 600 por semana com seus palpites. Ele alerta: quem diz que ganha mais que perde está mentindo.
“No começo era cerca de R$70, R$80 por semana. Depois que comecei a pegar a manha, empurrei o pé. Mas também já ganhei prêmios de R$ 4 mil”, afirma. Para vencer é preciso bater o chamado ‘pule’, nome popular do cartão de apostas, onde quem joga precisa ter 100% de aproveitamento para receber o prêmio.
Disponíveis pela internet e com bancas espalhadas tanto em periferias quanto em bairros nobres, não é difícil encontrar um local para fazer os palpites. Luiz mora no Alto do Pascoal, Zona Norte do Recife e afirma que cerca de 90% dos amigos mais próximos jogam e fazem disso um meio rápido para pagar as dívidas, já que os prêmios são pagos em 24 ou 48 horas. “O pessoal faz o seguinte: ‘tenho uma conta para pagar amanhã e não tenho esse valor’ aí vai na banca e joga. Mas eu tenho meu limite”.
Funcionário de uma banca no Alto do Pascoal, Alef Paulo afirma que em dias de jogos de futebol o movimento é mais intenso, gerando cerca de R$ 800 em apostas por dia.
“Já saiu premiação de R$ 8 mil, R$ 16 mil aqui e todo mundo foi pago, talvez com um prazo maior, mas recebem”, conta.
Ambição. Essa é a palavra-chave para o apostador Renato Baptista*, morador de Campo Grande. Assumidamente viciado, ele prefere dar seus palpites de casa ao invés de ir até as bancas e afirma como os sites fazem para conquistar o usuário. “Eu tinha uma certeza na cabeça: se eu começasse ia viciar, por isso relutei. No começo, oferecem bônus para estimular quem tá começando e aí o cara continua pra ganhar o que perdeu e fica num ciclo vicioso”, explica.
Segundo ele, o percentual de ganho não chega a 2%, mas a facilidade do jogo online e o uso do cartão de crédito fisgam o apostador. “Basta ter limite que em cinco minutos o cartão é aprovado e essa facilidade é o que motiva a apostar”. Sem emprego e de férias da faculdade, ele afirma que no último mês de julho o ócio o levou a se aventurar em esportes que não acompanha. “Uma vez tentei acertar quem faria um ponto qualquer em uma partida de vôlei, algo totalmente aleatório”. Atualmente, no entanto, ele já pensa em parar. “Recentemente passei três semanas sem jogar, então não é mais aquele vício forte. Tem uma hora que o cara vê que é feito de otário”, comenta.
Para a psicóloga Fabíola Barbosa, cada caso deve ser analisado de maneira particular, sempre respeitando o tempo e o interesse do paciente no tratamento. “É muito importante dar voz para que a pessoa tenha condições de se dar conta de quais são as suas motivações para jogar sem freios e com danos materiais, financeiros, psíquicos, afetivos e sociais tão grandes”, afirma.
Segundo os apostadores, geralmente quem joga não comenta em casa por ter receio da repercussão entre os familiares. “A palavra aposta é muito forte. Se eu chegar em casa dizendo que aposto e já perdi muito, soa mal”, afirma Baptista.
Mas, essa discussão é importante de acordo com a psicóloga. “A prevenção é sempre o diálogo aberto e franco em família, no trabalho, nas universidades, nas escolas. Não é adequado demonizar o jogo, culpando essa atividade pela dependência, mas sim acolher essas pessoas”, ressalta.