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Confiança, identidade e legitimidade: as verdadeiras crises do governo Lula

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Foto: reprodução

Por Carlos Andreazza* / Estadão

O governo Lula recuou – decisão nada técnica – porque sem meios de lidar com uma crise que, para muito além dos problemas de comunicação, tem fundamento na desconfiança. Porção gigantesca da sociedade não acredita no governo, sobretudo quando a matéria sugere-projeta o tema impostos. É uma crise de confiança.

Isso tem origem – carregando a memória popular – no episódio “taxa das blusinhas”. Mudou-se a tributação para importações miúdas. Em vez de se explicar as razões tributárias da mudança e justificar suas implicações no bolso das gentes, botou-se o bloco oficial na rua para defender que o consumidor não pagaria mais pelos produtos. O consumidor passou a pagar mais pelos produtos.

Crise também de identidade. Lula não conhece mais as pessoas; não lhes consegue tomar o pulso. E as pessoas, cujos interesses o presidente desconhece, estão convictas de que o governo se move para lhes tomar o dinheiro.

As pessoas não estão erradas. Sabem que o Pix não será taxado. (Ainda.) Sabem que a CPMF (ainda) não voltou. Não estão sendo enganadas pela exploração política – legítima – do caso pela oposição. (Ainda não é crime.) Entenderam que se trataria de acirramento de controle sobre suas movimentações financeiras e – subsidiadas pela história – estão convencidas de que esse monitoramento resultaria na imposição de imposto de renda sobre a economia informal.

O governo não derrubou a instrução normativa da Receita Federal porque distorcida-minada pela indústria fascista das fake news. Derrubou a norma porque sentiu o peso da impopularidade encarnada na certeza popular de que o cerco expandido do Fisco – que parece ter metas – jogaria imposto no lombo do trabalhador que vende almoço para poder jantar, esse sonegador.

A certeza popular está certa. O governo que reage acusando mentiras recuou porque é ele – o governo – o entendido como enganador.

É uma crise de legitimidade. Rejeita-se a natureza do governo Lula. Questão estrutural. Rejeita-se o esquema materializado no arcabouço (natimorto) fiscal. O governo – que se jacta de sucessivos recordes de arrecadação – é percebido como catador voraz de moedas, raspador de qualquer resto de dinheiro esquecido. Gasta muito e mal. Endivida-se. Não consegue equilibrar as contas. Donde se lança com tudo para cavar receitas. Também – e especialmente – sobre os mais pobres. Governo injusto.

A sociedade despreza essa estratégia covarde. A do governo que, incapaz de se articular e fazer carga para cortar a farra de benefícios fiscais aos ricaços, aponta o seu apetite sobre o ganho curto do ferrado.

*Andreazza foi colunista do jornal O Globo e âncora da Rádio CBN Rio, além de ter colaborado com a Rádio BandNews e com o Grupo Jovem Pan. Formado em jornalismo pela PUC-Rio, escreve às segundas e sextas.

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