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Devassa jurídica das emendas pode chegar a mais de uma dezena de partidos em ao menos 17 estados

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Foto: Agência Brasil

A falta de transparência e de rastreabilidade à destinação e aplicação de recursos bilionários das emendas parlamentares nos últimos quatro anos está colocando políticos da direita à esquerda no centro das investigações da Polícia Federal. A reportagem apurou que as suspeitas de ilegalidades podem envolver membros de até 13 partidos em 17 estados brasileiros. Se os policiais conseguirem comprovar as evidências iniciais, pode ocorrer uma grande devassa jurídica no Congresso.

A PF apura diferentes irregularidades e esquemas de desvio de recursos de emendas de Orçamento. As investigações se concentram em levantar provas sobre como ocorreram a operacionalização das irregularidades, as formas e metodologias de desvio de dinheiro, e quem são os possíveis grupos fraudadores e os beneficiários. Tudo deve ser concentrado em um mesmo inquérito que tramita agora no Supremo Tribunal Federal (STF).

De antemão, a PF já encontrou indícios que podem levar a deputados, senadores, operadores que atuavam como lobistas em Brasília, servidores públicos nos mais diferentes estados e municípios que eram peças-chave para fraudar e direcionar licitações superfaturando-as, e até terceiros que abriam empresas e forneciam contas laranjas para escoar os recursos – que podem chegar às cifras bilionárias em esquemas ocorridos nos últimos quatro anos.

Investigadores se prepararam para uma série de operações durante o ano de 2025, sobretudo neste primeiro semestre, após determinação de abertura de inquérito feita pelo ministro do STF Flávio Dino. No fim do ano, Dino bloqueou a liberação de R$ 4,2 bilhões em emendas. Ele voltou atrás no valor de R$ 370 milhões à saúde no último dia do ano passado, mas o fato de não ter saído em férias no recesso do judiciário foi providencial ao caso, afirmam fontes ligadas às investigações.

Antes mesmo do inquérito instaurado pela PF a pedido de Flávio Dino, operações deflagradas em diferentes estados do Brasil começaram a levantar suspeitas sobre os desvio dos recursos bilionários de emendas parlamentares.

Entre as apurações mais avançadas está a que revelou, no fim do ano passado, um lobby de operadores em Brasília, possivelmente evolvendo políticos e suas assessorias, que resultavam na liberação de verbas para municípios e estados parceiros. Tudo era previamente acordado com superfaturamento e direcionamento de obras e serviços que iam desde pavimentações, grandes edificações até serviços de dedetização.

Um dos esquemas criminosos revelados pela Polícia Federal recebeu o nome de operação Overclean. Segundo a PF, ela envolvia fraudes licitatórias e desvio de recursos públicos com foco em contratos superfaturados e lavagem de dinheiro que podem chegar a 17 estados. A PF ainda investiga se outros casos, em outros estados e com envios de recursos suspeitos de fraudes, operavam da mesma forma ou se tinham modo de atuação diferentes.

Segundo a PF, neste caso específico da Overclean a organização criminosa sediada na Bahia movimentou aproximadamente R$ 1,4 bilhão em emendas parlamentares em quatro anos, dos quais R$ 825 milhões correspondem a contratos com órgãos públicos somente em 2024. A operação resultou na prisão de 16 pessoas. Todas já estão em liberdade por decisão do Tribunal Regional Federal da 1º Região (TRF1) em Brasília.

Neste caso em específico, o esquema criminoso operava da seguinte forma: a fraude era estruturada a partir de contratos manipulados com o Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs), mas também envolvia outras instituições. A principal ação do grupo consistia no direcionamento de recursos de emendas parlamentares e convênios para licitações vencidas de forma fraudulenta por empresas e pessoas ligadas a administrações municipais e possíveis parceiros políticos em Brasília.

O STF quer saber se havia a participação, direta ou indireta, de deputados e senadores, bem como suas assessorias. Segundo a PF, esses contratos eram frequentemente superfaturados, e os desvios de recursos eram facilitados por servidores públicos cooptados pela organização criminosa. A Receita Federal detectou várias irregularidades, incluindo movimentações financeiras incompatíveis com a origem dos recursos, omissão de receitas e uso de intermediários – com empresas fantasmas e laranjas – para ocultar a origem dos valores ilícitos.

A estrutura da organização contava com operadores centrais e regionais, como o empresário José Marcos de Moura, conhecido na Bahia como Rei do Lixo, que após supostamente fazer a ponte da liberação das verbas na capital federal, intermediava a cooptação de servidores públicos para viabilizar o direcionamento de contratos fraudulentos. As investigações também indicaram que o grupo chegava a pagar propina para que concorrentes deixassem de concorrer a um certame.

A defesa de José Marcos de Moura não respondeu aos pedidos de entrevista feitos pela reportagem. Moura chegou a ser preso, mas foi liberado por determinação do TRF1 ainda em dezembro. As investigações indicaram que para garantir a aprovação dos contratos, as empresas envolvidas inflacionavam os preços dos serviços, cobrando valores muito acima dos praticados no mercado. A conivência de servidores locais auxiliava para os tais atos fraudulentos, inclusive com falsas medições de obras que justificavam a liberação de recursos.

As propinas eram pagas por meio de empresas de fachada e por meio de outras estratégias para ocultar a origem dos valores ilícitos. Além disso, a lavagem de dinheiro ocorria de forma sofisticada, com o uso de empresas de fachada controladas por laranjas e com alto volume de transações em espécie, facilitando a movimentação dos recursos em dinheiro vivo.

Nesta investigação, antes da abertura do inquérito solicitado por Dino, surgiram os nomes de dois parlamentares que não são considerados investigados por ora. O deputado federal Elmar Nascimento (União-BA) e de uma assessora do senador Davi Alcolumbre (União-AP). O deputado, o senador e a assessora parlamentar não responderam à reportagem.

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