Uma mentira repetida à exaustão pelo PT e pelos movimentos sociais de esquerda nos ataques contra o agronegócio foi desmascarada pelo próprio autor da Fake News. José Graziano da Silva, ex-ministro do Combate à Fome no primeiro governo Lula, confessou que ajudou a inventar que 70% dos alimentos produzidos no país são provenientes da agricultura familiar.
Foi durante um seminário sobre pobreza rural no semiárido nordestino, no início do mês. Graziano admitiu que os 70% foram inventados, sem nenhum respaldo na realidade. “Não acho que nós comemos as coisas que são produzidas pelos agricultores familiares. É um erro nós continuarmos pensando assim, faz parte da herança agrária e agronômica que nos atrapalha tanto. Hoje não são mais os agricultores familiares que alimentam a cidade. Pior que um erro, é um terraplanismo, é ignorar os números”, afirmou Graziano, considerado o “pai do programa Fome Zero”.
Destacando ser ele mesmo engenheiro-agrônomo, filho e pai de agrônomos, Graziano disse que sua fala estava isenta de qualquer preconceito. E foi enfático. “É vergonhoso ver hoje meus colegas do PT insistindo nos números que nós produzimos nos anos 70. Eu ajudei a calcular esses números. (…) No começo dos anos 2.000 nós acordamos: vamos começar a falar em 70% para não dar briga? Inventamos esse número de 70%. Esse número não tem em lugar nenhum”, admitiu Graziano.
Sem informações do Censo, decidiram inventar um número
Ao se justificar, o ex-diretor-geral da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) disse que não havia no início dos anos 2.000 um censo agropecuário atualizado. “O último censo que tínhamos era de 1970, então tivemos que inventar esse número. Então, por favor, vamos virar o disco”, afirmou para uma plateia atônita.
Curiosamente, um primo de José Graziano, o também engenheiro-agrônomo Xico Graziano, ex-deputado federal, há anos vinha denunciando a farsa de que a agricultura familiar põe 70% dos alimentos à mesa dos brasileiros. “Há duas décadas lutamos contra esse mito. Em nosso livro, ‘Agricultura, fatos e mitos’, publicado há quatro anos, mostramos que tal afirmação era na verdade uma fake News, repetida há tanto tempo, e de forma tão frequente, que se confundia com a realidade”, comentou Xico Graziano, em artigo.
“Estamos há anos procurando quem criou essa narrativa de que o agronegócio produz só gêneros de exportação, e quem alimenta o povo é a agricultura familiar. Nunca descobrimos. Agora, a verdade veio à luz”, sublinhou. Para Xico Graziano, seu primo teve uma honestidade “raríssima nos intelectuais-políticos de esquerda” e deixou claro a origem dos 70% que, para ele, é “o maior mito sobre a agricultura brasileira”.
Quem primeiro confrontou a propaganda oficial que exagerava os méritos da agricultura familiar foi o professor Rodolfo Hoffmann, da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz – ESALQ-USP. Há dez anos, Hoffmann escreveu um artigo em que afirmava ser “espantosa a reprodução sem crítica da porcentagem (70%), porque a afirmativa, em si, não faz sentido”.
No ano passado, o assunto foi tema da reportagem da Gazeta do Povo “Agricultura familiar não precisa da falsa propaganda de que produz 70% dos alimentos”. Conforme o censo agropecuário de 2017, as propriedades enquadradas como de agricultura familiar respondiam por apenas 23% do valor total da produção dos estabelecimentos agropecuários. Apesar disso, a distorção continuava a integrar documentos do governo, falas de secretários e ministros.
Na narrativa que opõe o agronegócio à agricultura familiar, a tese repisada é de que os pequenos agricultores dão segurança alimentar ao país, enquanto a agricultura empresarial só envia commodities para a China. No atual governo, essa dicotomia foi enfatizada pela divisão do Ministério da Agricultura, que perdeu atribuições para o recriado Ministério do Desenvolvimento Agrário.