O prefeito do Recife, João Campos (PSB), disse à Folha que a centro-esquerda precisa, na sua avaliação, ter uma melhor preparação para as disputas eleitorais. Reeleito com 78% dos votos válidos no primeiro turno no domingo (6), ele acredita que a polarização afasta o debate sobre a eficiência das administrações públicas.
“Nos grandes conflitos ideológicos de esquerda e direita, tem questões que são valorosas para os dois campos, mas que, na prática, não são a essência das demandas do dia a dia de uma cidade”, afirma.
“A polarização traz um embate que cria uma cortina de fumaça para os desafios reais da gestão de uma cidade.”
Sobre o segundo turno em São Paulo, João Campos disse que sua namorada, Tabata Amaral (PSB), tem autonomia para tomar a decisão de se engajar ou não na campanha de Guilherme Boulos (PSOL) contra Ricardo Nunes (MDB).
Mesmo após a eleição, o prefeito reeleito também evitou se comprometer se terminará o mandato ou se sairá do cargo para ser candidato a governador contra Raquel Lyra (PSDB) daqui a dois anos. “É muito cedo para você cravar quem será candidato a que em 2026.”
Como assimilou o percentual de 78% dos votos em uma sociedade sob polarização?
Ainda não assimilei. Em 2020, tive 29% dos votos no primeiro turno. Agora, 78, quase 50 pontos acrescentados. Não imaginava que terminaria com o tamanho da votação que eu terminei.
Qual conselho daria para outros quadros da esquerda para tentarem furar a bolha ideológica?
Precisamos fazer e mostrar a capacidade de juntar. Nos grandes conflitos ideológicos de esquerda e direita, tem questões que são valorosas para os dois campos mas que na prática não são a essência das demandas do dia a dia de uma cidade. E quando é que você vê a pauta da polarização ser a eficiência da gestão pública? A polarização traz um embate que cria uma cortina de fumaça para os desafios reais da gestão de uma cidade.
O PSD e o MDB foram os partidos que mais elegeram prefeitos no Brasil. O senhor acha que Lula tem que se aproximar mais desses dois partidos mirando 2026?
Acho que o movimento é diferente, não é o movimento do presidente buscar esses partidos, mas eu acho que é dos partidos principalmente do campo da centro-esquerda se posicionarem com a capacidade de resultados mais expressivos no campo eleitoral. O PSB, por exemplo, cresceu 20% em número de prefeitos e foi o primeiro posicionado dentre os do campo progressista.
Para ajudar a viabilizar uma reeleição de Lula, seria importante essa aproximação?
São dois partidos que fazem parte do arco de aliança dele. O PSD está presente dentro do governo federal e de São Paulo, um pé em cada canoa, como é de costume do partido. Mas acho que é uma avaliação que cabe ao presidente.
Mas e a sua visão?
Acho que a arrumação do governo federal é muito mais voltada em função do Parlamento do que das cidades. E acho que um dos componentes que interfere no tamanho dessas votações e no crescimento dos partidos é a força e a presença desses partidos no Congresso Nacional.
O sr. fala sobre emendas e a influência no Orçamento?
Sim.
Durante a campanha eleitoral, o senhor evitou dizer se cumpriria o mandato até o fim.
Ainda estamos depurando os números e vou retribuir com trabalho. Uma eleição não pode ser feita dentro da outra. É muito cedo para ter uma posição sobre o que é que acontecerá na eleição de 2026.
Por que, mesmo depois da eleição ter passado, tem dificuldade em responder isso?
Porque o que eu estou dizendo é verdade. É muito cedo para você cravar quem será candidato a que em 2026.
Acha que a esquerda saiu derrotada no plano nacional?
Temos um fortalecimento do centro pragmático. Há um movimento de maior força pendendo para a direita. E esse resultado tem que ser analisado. Os partidos que têm uma construção mais profissional com lógica resultadista e os com maior presença no Congresso também têm mais volume de prefeituras. E o terceiro ponto é essa distribuição que há nas regiões metropolitanas do Nordeste, que cada vez mais têm uma posição que se assemelha mais às regiões metropolitanas de outras regiões, por causa dos problemas urbanos.
O sr. defende que Tabata Amaral se engaje na campanha de Boulos no segundo turno em São Paulo?
Ela foi uma grande candidata, sai maior do que entrou. Teve uma grande vitória política e mostrou que está preparada para uma grande caminhada. Tem autonomia e legitimidade para tomar a posição relativa a São Paulo. Ela tem capacidade para fazer o que é melhor a ser feito.
Vê espaço na política brasileira para políticos como Pablo Marçal?
Infelizmente, há espaço por causa da degradação do sistema político, mas não deveria haver. A institucionalidade vai ter que se impor. Há aparentes flagrantes de descumprimento da legislação eleitoral de todos os níveis possíveis. E a Justiça Eleitoral vai ter que deixar claro o que pode e o que não pode. O remédio para quem se porta como ele é a lei.
O PSB tem 31 prefeitos eleitos em Pernambuco. Junto com partidos aliados, supera 70. A base aliada do governo Raquel Lyra fez ao menos 90, sendo 31 do PSDB. Como avalia isso pensando em 2026?
26% dos eleitores de Pernambuco serão governados pelo PSB. O segundo é o PSDB com 10%. De prefeitos eleitos, tivemos mais votação que o PSDB. Nos últimos anos, não houve um partido de oposição com a maior parte de prefeitos eleitos. Dos 10 maiores colégios eleitorais de Pernambuco, 6 prefeitos eleitos são da oposição. Tivemos a maior votação da história do Recife. Fomos vitoriosos.
Quantidade de prefeito é determinante para a eleição estadual, na sua visão?
Não é determinante. É importante. Em 2006, Eduardo Campos tinha poucos prefeitos [aliados] e venceu. Raquel venceu em 2022 com quantos prefeitos apoiando?
RAIO-X | João Henrique de Andrade Lima Campos, 30
Prefeito reeleito do Recife, é vice-presidente nacional do PSB. Formado em engenharia civil pela Universidade Federal de Pernambuco, foi deputado federal de 2019 a 2020, quando foi eleito prefeito do Recife pela primeira vez. É filho do ex-governador de Pernambuco Eduardo Campos (1965-2014).