Foto: Agência BrasilPor Folha de São Paulo
O aumento do clima de insatisfação no Congresso com a atuação do Supremo Tribunal Federal foi um dos principais assuntos de um jantar entre o presidente Lula (PT) e quatro ministros da corte na noite desta segunda-feira (15) em Brasília.
Segundo relatos colhidos pela Folha, o tom da conversa foi de preocupação com o avanço das reclamações e principalmente com a constatação de falta de ação por parte de políticos mais alinhados para blindagem do tribunal.
A percepção de que o clima vem se deteriorando em relação ao STF se acentuou após as acusações por parte de Elon Musk contra Moraes sobre censura, ao criticar ordens de bloqueio de contas na rede social X.
O jantar ocorreu na casa de Gilmar Mendes, em Brasília. Além deles, estavam presentes os ministros Flávio Dino, Cristiano Zanin e Alexandre de Moraes, o principal alvo de críticas no Congresso. Lula foi acompanhado dos ministros Ricardo Lewandowski (Justiça) e Jorge Messias (Advocacia-Geral da União).
No fim de 2023, quando a pauta anti-STF ameaçava avançar no Senado, Arthur Lira (PP-AL) vinha garantindo nos bastidores que não permitira que esses temas andassem na Câmara. A situação agora mudou. Lira passou a articular formas de limitar os poderes da corte.
No jantar, os ministros pediram ao presidente da República maior empenho do governo em defesa da democracia e do próprio Supremo, explicitando a visão de que a corte está sob ataque.
Segundo um dos participantes, a avaliação foi a de que o STF vem assumindo um protagonismo contra iniciativas antidemocráticas e, por isso, é alvejado pela direita. Um dos diagnósticos foi a falta de um coro governista em defesa de propostas encampadas pelos ministros, como a questão da regulação das redes.
Entre integrantes do centrão, há uma lista de episódios que provocaram aumento de insatisfação com o Supremo: buscas e apreensões autorizadas contra parlamentares, manutenção de sigilo em diversos casos relatados por Alexandre de Moraes e a prisão do deputado Chiquinho Brazão (sem partido-RJ), segundo dizem esses deputados, sem existência de um flagrante.
Os participantes do jantar também listaram medidas do Congresso que acabam por exigir uma resposta do Judiciário e elevam a tensão entre os Poderes.
Entre o exemplos citados, estão o marco temporal das terras indígenas, o projeto que acaba com as saídas temporárias de presos e a proposta para criminalização do porte de drogas —este na contramão da tendência de descriminalização da maconha para uso pessoal em avaliação pelo STF.
Menos de 24 horas depois desse jantar, o Senado aprovou nesta terça-feira (16) em primeiro e em segundo turnos a proposta que coloca na Constituição a criminalização de porte e posse de drogas, em reação ao julgamento do STF.
Lula teria concordado, no jantar, com a necessidade de maior ajuda da base governista. Mas essa conversa não tinha como objetivo a adoção de medidas práticas. Segundo pessoas ouvidas pela reportagem, outros encontros semelhantes deverão ocorrer nas próximas semanas, para novas avaliações de cenário.
O presidente do tribunal, Luís Roberto Barroso, não participou do jantar. Como mostrou a Folha, Barroso se indispôs com Gilmar e Moraes em julgamentos nos últimos meses, colocando em risco seu poder de articulação no tribunal na posição de chefe da corte.
O presidente do STF disse na segunda-feira que considera “assunto encerrado” a questão envolvendo o empresário Elon Musk.
O jantar aconteceu sob as ameaças de Lira de que esta semana pegaria fogo. O avanço do julgamento do foro especial no STF e a atuação de aliados do governo Lula para manter a prisão de Chiquinho Brazão ampliaram os atritos entre Câmara, Planalto e a corte.
Irritado, Lira chamou de incompetente o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha (PT), a quem se referiu como um desafeto. O governo teme retaliações.
Já o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), defende a limitação de decisões individuais da corte.
Reconhecendo a delicadeza da situação, aliados do presidente admitem que hoje o governo tem menor capacidade de influência no Congresso. Na avaliação de uma participante do jantar, o governo tem aprovado suas propostas “a duras penas”.
Sob reserva, aliados do presidente também ponderam que decisões dos ministros conferiram protagonismo ao tribunal, o que provocou a reação no Congresso.