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Caatinga, água e o planeta Terra

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Foto: reprodução

Por Geraldo Eugênio / Jornal do Sertão

Nos últimos dois meses comemoramos o dia da  caatinga,  da água e a semana da Terra. Um alerta para os riscos que a humanidade corre em não cuidar devidamente bem desses ativos inegociáveis. A caatinga, sendo um bioma exclusivamente  brasileiro dever ser objeto de cuidados especiais pelo país e, em particular por todos que habitam esta vasta área de semiárido que representa um milhão e cem mil quilômetros quadrados. Tal como indicam alguns estudos que  nos últimos anos tem havido uma constante erosão da cobertura vegetal devido ao desmatamento com dados que merecem ser aferidos mas que indicam para uma massiva extinção de espécies.

A água, como bem indispensável à vida, tem sido objeto de ações estratégicas, dentre essas que se ressalta a transposição das águas do Rio São Francisco, algo que beneficia ao redor de doze milhões de nordestinos. Algo absolutamente inacreditável para os padrões locais de planejamento a longo prazo. Há de se reconhecer que a atenção com o Rio São Francisco deve ser ainda mais aguçada, seja no uso das águas do Maciço de Urucuia para a agricultura irrigada do oeste da Bahia, seja no abastecimento de centenas de distritos e municípios dos estados do Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe e Bahia. No entanto,  as condições atuais do uso desta água para grandes perímetros irrigados como alguns formuladores de políticas de estados críticos do ponto de vista de segurança hídrica chegam a imaginar.

Por último vem o planeta terra, a casa de todos nós, é indiscutivelmente um ambiente sob constante ameaça não por seres alienígenas mas por aqueles que habitam seu território. As evidências sobre uma mudança climática em curso, principalmente devido a atividade humana e o padrão de vida que escolheu são nítidas. Mesmo assim, um número pequeno de insistentes negacionistas tentam a todo custo vender uma situação utópica de que está ocorrendo com o clima do planeta nada tem a ver com o uso massivo de combustíveis fósseis emitindo gás carbônico para a atmosfera ou as queimadas intencionais e desenfreadas que a todo tempo ocorrem não apenas no Brasil e em várias regiões do planeta. Certamente, esses falsos cientistas e seus seguidores devem colocar de lado os interesses econômicos, comerciais e voltar a ver o problema unicamente do ponto de vista científico. Não dá para continuar tentando jogar o lixo para debaixo do tapete, esta é a realidade.

As opções para o Semiárido

Concomitantemente às celebrações e alertas, uma enxurrada de ideias bem intencionadas jorram de instituições públicas procurando conter o desmatamento da caatinga, a desertificação em curso, o uso mais efetivo das águas e o bem estar da população dos que vivem sob risco. Uma pena que a maioria das ideias sejam moldadas a partir de percepções de quem não está de fato no semiárido e que consideram que apertando o botão de comando, mesmo que em muitos casos tendo por trás a tão sonhada ´participação popular` sejam exequíveis. É importante que essas iniciativas e políticas sejam objeto de planejamento um pouco mais detalhado e implementadas com critério e a devida parcimônia, ao invés da fanfarra que normalmente antecede os anúncios de mudanças à vista. Neste sentido,  partir da convivência no semiárido se relaciona um conjunto de atitudes ou ideias que podem ser implementadas. Algumas dessas a baixo custo de forma que se trabalhe na direção da preservação da caatinga, das águas e na defesa de nossa casa comum, a Terra.

Um caminho mais curto a seguir

         Vejamos algumas dessas proposições

A legislação ambiental e o código Florestal

O Brasil é um país que conta com uma das mais avançadas legislações ambientais do mundo. Fruto de uma luta magnífica por aqueles que consideram os biomas e o meio ambiente como valores inquestionáveis. Venceu-se preconceitos, negociou-se com os céticos, limitou a sanha destrutiva de boa parte do congresso e, ao final, há uma lei norteadora, decretos complementares e seus dispositivos a serem cumpridos. O que as instituições públicas, as empresas e a sociedade têm feito em defesa da real implementação dessa legislação? Há boa vontade em relação ao fato ou um mero fazer de contas?

Coibir o desmatamento

No caso do Semiárido há conhecimento mais do que devido de onde se encontram os sumidouros da caatinga, de quem desmata, de quem usa a lenha de forma ilegal mas ao que parece essas informações não têm servido para controlar a redução da cobertura vegetal que, conforme os dados indicam, tem sido intensa. E aí, o que esperar dos órgãos de controle cujas representações estão dispersas em todo os territórios ameaçados? Espera-se que cumpram com os mandatos que a eles foram atribuídos por lei e se faça cumprir o trabalho da forma devida.

O pousio

Fala-se muito em reflorestamento, recatingamento, normalmente a partir de exemplos que vêm de outros países, notadamente a Ásia, mas pouco se discute a efetividade dessas propostas. Basta lembrar o grande esforço que foi o de se plantar milhões de mudas de árvores nativas nas margens do Rio São Francisco, na primeira década deste século, quando a discussão sobre a efetividade da transposição era mais intensa. Seria importante voltar às áreas contempladas com recursos substantivos e checar o percentual de plantas sobreviventes após quinze anos desse programa. A alternativa que se propõe é o tradicional pousio para as áreas alteradas. Quanto à recomposição da cobertura vegetal, ninguém melhor do que os preás, os mocós, os pássaros, os morcegos, os macacos, as abelhas podem ser mais efetivos. A reconstituição de um ambiente degradado toma tempo. Dezenas de anos. Neste sentido,  será importante avaliar se uma política de compensação ambiental aqueles que conservarem as áreas desmatadas não seria mais efetiva. Mudam-se os tempos mas os termos continuam os mesmos. Neste caso, nada de neologismo ou busca de outra denominação, o correto é se retornar às práticas de pousio e recomposição florestal.

Tornar o ambiente produtivo e com característica empresarial

A defesa de qualquer bioma ou dos recursos naturais passa obrigatoriamente por dotar a população que ali vive de condições dignas que permitam um ambiente saudável e próspero. Não seria lógico imaginar que o pequeno e médio produtor do Semiárido, que constitui o cerne da agricultura familiar, não deve ser objeto de afinidade com as tecnologias agrícolas, de previsão e  monitoramento climático, de formação profissional e comércio tão sofisticadas quanto às demais atividades econômicas? Normalmente a população se vê refém de uma visão negativa e um mantra que já poderia haver sido erradicado mas que persiste não apenas na mente de quem não conhece a região mas em boa parte dos que nela habitam, de que a região Semiárida, seca e desinformada será objeto primordial de políticas sociais e compensatórios. É importante que se abra os olhos. Isto é um pensamento retrógrado e que não reflete a situação atual da região.

Políticas de apoio à apicultura

A apicultura merece uma chamada especial. Tem sido a atividade econômica mais efetiva na defesa da vegetação, da microbiota e das águas da caatinga simplesmente pelo fato de que as abelhas necessitam de flores para sobreviverem, produzirem o mel, a própolis, a cera e tantos outros produtos. Os apicultores e meliponicultores são a principal brigada de defesa do semiárido. Defendem o ambiente, produzem uma gama de matérias primas nobres usadas na alimentação, na cosmética, na farmácia e reconheça-se, nem sempre esses esforços têm recebido a devida atenção, particularmente dos gestores locais.

A bioeconomia da caatinga

Fala-se também muito em bioeconomia da caatinga mas pouco se fala na riqueza do que é o patrimônio genômico e as informações nele contido que faz com que as plantas, os microrganismos e a fauna do Semiárido sejam resistentes às intempéries climáticas em um ciclo que se repete há centenas de milhares de anos. Enquanto não se contar com programas coordenados e dirigidos à identificação, catalogação e uso dessa informação genética, não se dá a devida atenção ao patrimônio. O futuro da agricultura mundial passa necessariamente pelo patrimônio genético das áreas semiáridas do planeta. A forma de se implementar é passível de análise, mas a premência inquestionável.

Gestão das secas

Este é um tema recorrente em discussão. Enquanto o país não considerar o tema como estratégico para a nação e pautar a ação de mitigação em políticas emergenciais, não há como se sair do lugar. A seca deixou de ser uma questão de Graciliano Ramos ou de João  Cabral de Melo Neto. Se vivessem ainda hoje ela poderia estar nas obras de João Guimarães Rosa ou Érico Veríssimo, esta é a realidade que anos após ano o país se depara. O entendimento tem sido mínimo e a abordagem um tanto amadora. Esta é nossa opinião.

Esses são ideias para reflexão. Podem parecer absurdas, tendenciosas, pouco efetivas mas é a expressão de quem tem convivido com o dia a dia do Semiárido.

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