Julgamentos que foram suspensos em 2023 no Supremo Tribunal Federal (STF), e que têm potencial para gerar decisões de grande impacto, poderão ser retomados em 2024 ou 2025. Entre as ações que mais geram apreensão estão a que pode liberar o aborto até a 12ª semana de gestação, a ação sobre a descriminalização do porte de maconha para consumo pessoal, e a que pode liberar de vez que políticos assumam o comando das empresas estatais. Há ainda a ação que pode aumentar os saldos do FGTS de empregados formais.
Em todos esses casos, pedidos de vista de ministros adiaram um desfecho. Com a nova regra interna que limita a 90 dias o tempo em que cada um deles fica com o processo, as ações serão novamente liberadas para julgamento no plenário ao longo deste ano. Caberá ao presidente da Corte, Luís Roberto Barroso, marcar a data da retomada de cada um desses julgamentos.
Ele já confirmou, por meio de sua assessoria, que o julgamento sobre a maconha voltará à pauta no início de 2024, a partir de fevereiro, após o recesso de janeiro. O julgamento sobre o aborto, ele adiantou, não será retomado no curto prazo; é possível que fique para 2025. Quanto aos demais, ainda não há previsão.
Após o prazo de vista, a data não é necessariamente marcada de imediato, o que abre espaço para um tempo maior de espera – o período extra é útil para o tribunal dialogar com outros Poderes, para verificar se novas normas podem surgir e criar soluções alternativas, fazendo a ação perder objeto. Essa avaliação se tornou mais importante no período recente devido à crescente insatisfação de parlamentares com decisões que contrariam setores organizados representados no Legislativo.
É exatamente o caso do aborto, que deixa alarmada a bancada religiosa (formada por evangélicos, católicos e espíritas), refratária a qualquer flexibilização nas atuais regras sobre o tema e também sobre as drogas. Em relação ao FGTS, a maior preocupação vem do governo federal, que não quer desembolsar mais recursos no fundo, com um novo índice de correção.
O risco de uma decisão do STF nos dois primeiros temas, principalmente, é de um “backlash”, isto é, uma reação do Congresso em direção oposta com uma nova lei ou emenda constitucional. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), por exemplo, já anunciou ser a favor de uma proposta de emenda à Constituição que explicite o porte de drogas como crime, que derrubaria uma eventual descriminalização pelo STF. O mesmo poderia ocorrer em relação ao aborto.
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), criticou as intromissões do STF em assuntos do Legislativo em entrevista nesta semana. “O Congresso Nacional, às vezes, quando decide não legislar, está legislando. Não abre espaço para que outros poderes o façam”, disse ele à TV Câmara.
No caso da maconha, falta apenas um voto a favor para a descriminalização. Já votaram desse modo Gilmar Mendes, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Alexandre de Moraes e Rosa Weber. O único a votar contra, até o momento, foi Cristiano Zanin. André Mendonça, que pediu vista, também tende a ser contra. Depois dele, deverão votar Kassio Nunes Marques, Cármen Lúcia, Dias Toffoli e Luiz Fux.
Quanto ao aborto, há apenas um voto, favorável, de Rosa Weber, que já se aposentou. A vista foi pedida por Barroso e ele disse que vai liberar o caso somente quando o debate estiver mais maduro na sociedade – ele é favor da descriminalização.
Já em relação ao FGTS, três ministros votaram para reajustar o FGTS pela poupança, índice maior que a atual Taxa Referencial. O ministro Cristiano Zanin, ex-advogado de Lula e colocado por ele na Corte, pediu vista. Caso se forme maioria pela correção da forma já defendida por três ministros, a conta passaria dos R$ 8,6 bilhões nos próximos 4 anos, nas projeções mais otimistas do Executivo.
Na área política, o governo já conseguiu uma vitória, no início deste ano, com a liminar do então ministro Ricardo Lewandowski, que liberou a nomeação de políticos para cargos de direção nas estatais. No início de dezembro, o plenário passou a analisar a liminar; André Mendonça votou para derrubá-la e restabelecer a restrição, mas Nunes Marques pediu vista.