Um dia após a morte de um preso do 8 de janeiro, as intensas e variadas reações indignadas que essa notícia provocou em parlamentares e em cidadãos engajados nas redes sociais pareciam sugerir nova tônica para as ações de enfrentamento do chamado ativismo judicial. Nos corredores e plenários do Congresso circularam pregações de protestos nas ruas, abertura de processo de impeachment contra o ministro Alexandre de Moraes e também voltou-se a mencionar a necessidade da criação de uma comissão parlamentar de inquérito (CPI) para investigar abusos do Supremo Tribunal Federal (STF).
A morte de Cleriston Pereira da Cunha, 46, foi vista por alguns parlamentares como resultado da associação entre negligência e abuso da Corte. O réu estava detido por mais de 10 meses sem sentença definida e aguardava há dois meses e meio pela liberação por razões de saúde. O caso aumentou a pressão especialmente sobre o ministro relator dos inquéritos do 8 de janeiro, Alexandre de Moraes, atual recordista de pedidos de impeachment no Senado.
Por ora, um grupo com mais de 50 parlamentares da oposição cobrou do STF esclarecimentos sobre a morte de Cleriston e a não apreciação dos pedidos de liberdade dos presos com parecer favorável do Ministério Público Federal (MPF).
Deputados da oposição também se articulam para buscar as 23 assinaturas que faltam para abrir a CPI do Abuso de Autoridade, proposta pelo deputado Marcel van Hattem (Novo-RS) ainda no ano passado. Eles também pretendem pressionar pela aprovação do pedido de impeachment contra Moraes, mas a facilidade em protocolar um novo pedido esbarra no poder monocrático do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), para encaminhar ou não a medida.
Oposição no Senado está preocupada com aprovação da PEC das monocráticas
Na Câmara Alta, a morte do réu também gerou indignação da oposição. O senador Eduardo Girão (Novo-CE) chegou a classificar o enfarto fulminante do empresário brasiliense de divisor de águas em relação à luta pelo devido processo legal para os detidos. Outros senadores também lamentaram a fatalidade e cobraram respostas. Contudo, as reações foram mais moderadas do que na Câmara, devido a uma preocupação sobre a votação, na tarde desta terça-feira, da proposta de emenda constitucional (PEC) que limita os poderes individuais dos ministros do STF.
Líderes da oposição temiam que a mobilização desmotivasse senadores próximos ao governo, que já estavam inclinados a votar a favor da proposta. A figura do presidente do Senado retornou ao centro do conflito entre Legislativo e Judiciário, pois é o único capaz de pautar o impeachment e de apartar os conflitos de plenário. Engavetada há dois anos, a PEC das decisões monocráticas, do senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR), ganhou impulso nas últimas semanas graças a uma reação coordenada do Senado, com decisivo apoio do seu presidente, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
O discurso predominante que vinha sendo usado por senadores, sobretudo pelo líder da oposição no Senado, Rogério Marinho (PL-RN), era o apelo à racionalidade e a concertação, buscando o resgate das prerrogativas do Legislativo em vez de cair na vala comum da vingança e da busca para retaliar abusos.
Para completar a mudança de cenário no plenário do Senado em dia de uma votação histórica, circulou a notícia de que o próprio presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, retomou uma velha prática de influir o voto dos senadores, telefonando diretamente para cada um deles.