Um novo estudo publicado na revista médica NEJM, neste mês, aponta que 98% dos afetados pela varíola de macaco no surto de 2022 são homens gays ou bissexuais, com idade média de 38 anos, sendo o contato sexual o meio provável de transmissão da doença em 95% dos casos. A pesquisa colaborativa envolveu mais de 30 profissionais de saúde ao redor do mundo, que analisaram amostras de 528 pacientes infectados com a varíola de macaco, em 16 países. Os pesquisadores descobriram que 41% deles são portadores do vírus HIV, causador da AIDS, e seis entre 10 faziam uso de um medicamento conhecido como PrEP (Profilaxia Pré-Exposição), uma combinação preventiva de antirretrovirais administrada a pessoas não infectadas com HIV, mas expostas a situações altamente vulneráveis ao vírus, como comportamento sexual de risco.
Para investigar o papel do ato sexual na transmissão da varíola de macaco, além do histórico dos homens em eventos eróticos, os autores do estudo notaram que 91% de um subgrupo testado tinham o vírus no líquido seminal. Embora não seja possível afirmar diretamente a transmissão sexual, os estudiosos apontam que, ao analisar a atividade sexual de 406 homens da amostra, o número mínimo de parceiros sexuais deles no trimestre anterior foi de três, e o máximo foi de 15. Os cientistas também separaram um grupo de 377 dos homens para analisar outras doenças sexualmente transmissíveis, e 30% testaram positivo.
Falando à imprensa nesta quarta-feira (27), o diretor da Organização Mundial da Saúde, Tedros Adhanom Ghebreyesus, pediu aos homens que fazem sexo com homens que reduzam o risco de exposição. “Isso inclui, para o momento, reduzir o seu número de parceiros sexuais, reconsiderar o sexo com novos parceiros e compartilhar detalhes de contato com quaisquer novos parceiros para permitir um acompanhamento, se necessário”, declarou.
Os sintomas mais comuns entre os infectados pela varíola de macaco foram irritações na pele (95%), sendo que a maioria teve menos de dez lesões (64%), geralmente na forma de pústulas (58%). Lesões genitais ou anais apareceram em 73% dos casos, e 10% desses homens tinham uma única ferida no pênis — a mesma quantidade apresentou lesões nas palmas das mãos ou solas dos pés. Antes de surgirem as lesões, 62% sentiram febre, uma quantidade similar teve inflamação nos gânglios linfáticos, e menos da metade sentiram letargia, dor muscular e dores de cabeça. Não houve óbitos, somente 13% precisaram de hospitalização, em geral para tratar a dor nos locais das lesões.
O período de incubação do ortopoxvírus da varíola símia foi de sete dias em média, variando entre três e 20 dias. Diferentemente do vírus da Covid-19, que usa o RNA como material genético, o ortopoxvírus símio usa o DNA. O primeiro caso em humanos foi documentado na República Democrática do Congo em 1970, durante a campanha de vacinação contra a varíola humana. Apesar do nome, a varíola de macaco tem como reservatório mais comum na natureza os roedores, especialmente na África, de onde vieram roedores que causaram um surto da doença nos Estados Unidos no começo dos anos 2000.
Além do contato sexual, a transmissão pode se dar também por grandes gotículas respiratórias, do tipo que máscaras barram, contato direto com as erupções da pele de uma pessoa infectada, além de objetos em que o contato pode ter sido feito, como roupa de cama. Os pesquisadores pensam que o vírus pode ter circulado nas áreas endêmicas da África confundido com outras doenças sexualmente transmissíveis.
O estudo publicado na revista NEJM utilizou dados de detecção da varíola de macaco pelo método de reação em cadeia de polimerase (PCR), um dos mais precisos para detecção de patógenos. Dos 528 casos analisados, 527 eram do sexo masculino (509 se declararam homossexuais, 10 bissexuais e 9 heterossexuais) e 1 paciente era trans. A idade dos pacientes variava de 21 a 62 anos, com média de 38 anos. Na América do Sul, houve coleta de casos na Argentina, mas não no Brasil. Compartilham a primeira autoria do estudo John Thornhill, de três instituições britânicas incluindo uma entidade de financiamento de pesquisa do Serviço Nacional de Saúde do Reino Unido; Sapha Barkati, do Centro de Saúde da Universidade McGill no Canadá; e Sharon Walsley, da Rede de Saúde da Universidade de Toronto, no mesmo país. (Gazeta do Povo)