Por 25 votos a sete, com duas abstenções, o plenário da Câmara Municipal de Curitiba votou, nesta terça-feira (21), pela cassação do vereador Renato Freitas (PT). O plenário aprovou projeto de resolução do Conselho de Ética da Casa, que recomendava a perda de mandato por perturbação de culto religioso e realização de manifestação política no interior da Igreja do Rosário, em 5 de fevereiro, durante protestos contra a morte violenta de dois homens negros. A cassação do mandato do vereador ainda precisa ser ratificada na votação em segundo turno, prevista para a quarta-feira (22).
A votação da resolução aconteceu em sessão especial na tarde desta terça-feira, depois que a juíza Patrícia Bergonse, da 5ª Vara de Fazenda Pública de Curitiba revogou, na última segunda-feira (20) sua própria decisão liminar que impediu a realização da sessão inicialmente prevista para 19 de maio. Bergonse condicionou a realização da sessão plenária à conclusão da Sindicância conduzida pela Corregedoria da Câmara sobre email racista enviado a Freitas com o endereço eletrônico do vereador Sidnei Toaldo (Patriota), relator do processo ético contra o petista, constando como remetente. Com a conclusão da sindicância, indicando que o email não foi disparado por Toaldo ou por ninguém de seu gabinete, sendo fruto de um fraude, em um servidor da República Tcheca que permite adulterar o remetente, a juíza autorizou a votação.
Assim que tomou conhecimento da decisão judicial, o presidente da Câmara, Tico Kuzma (Pros) marcou a sessão extraordinária. A defesa de Freitas alega que prazos legais não foram cumpridos, sustentando que sequer havia sido citada da reversão da liminar e que seu cliente também não foi notificado com 24 horas de antecedência sobre a marcação da sessão. Na tarde desta terça-feira, nem Freitas nem nenhum representante legal de sua defesa compareceu à sessão.
A insegurança jurídica quanto aos prazos para a votação da perda do mandato do vereador foi levantada pelos vereadores Professor Euler (MDB) e Dalton Borba (PDT) durante a sessão. Mas o presidente da Casa, Tico Kuzma, assegurou que estava juridicamente embasado para realizar a votação nesta terça-feira e que todos os prazos legais foram respeitados.
Antes da votação, quatro vereadores contrários à cassação de Freitas manifestaram-se na discussão do projeto de resolução. Dalton Borba (PDT), mais uma vez, abordou a questão jurídica e o risco de o processo, mais uma vez, parar na Justiça por conta de prazos que, segundo ele, não estariam sendo respeitados. Professora Josete (PT) disse que não houve quebra de decoro no ato de Freitas “Por que é que o vereador Renato Freitas precisa ser cassado? Por um ato de protesto que aconteceu no Brasil inteiro naquele dia, contra o racismo estrutural de nosso país, na Igreja do Rosário dos Pretos? Onde ninguém cometeu nenhum ato violento e não danificou qualquer objeto da igreja. Não há nada, neste ato, que configure quebra de decoro”. Já Carol Dartora (PT) atribuiu a cassação de Freitas ao racismo estrutural na Câmara de Curitiba. “Curitiba assiste, hoje, um ataque à democracia proporcionado por essa casa por meio de um espetáculo. Espetáculo de sofrimento, de ódio, de escracho público, que escancara as barreiras invisíveis e intransponíveis do racismo estrutural que vivemos nessa cidade. O mandato de Renato Freitas, representante eleito com 5 mil votos pela periferia e pela comunidade negra da cidade está sofrendo um golpe, um ato explícito de silenciamento da voz que o povo escolheu para representa-lo”.
Membro do Conselho de Ética e autora de um voto em separado pelo arquivamento do caso, Maria Letícia (PV) disse não haver, nas provas e depoimentos colhidos no processo, motivos para a cassação do vereador. “Participei de todo o processo e tenho muita dificuldade de entender como fomos parar aqui. Não foram produzidas provas que justificassem o que está sendo pedido e lamento por todos os colegas que estão ignorando isso. Se essa cassação se confirmar estaremos dando um exemplo pavoroso do que é fazer política, passando o recado de que a política é para poucos. Os documentos estão aí, são públicos e quem ler os relatórios percebe que não houve invasão da igreja, não houve manifestação partidária dentro da igreja por parte do vereador Renato, ele não era o “dono” da manifestação e, por isso não pode ser responsabilizado por atos de terceiros, e não houve interrupção de culto, já que a missa já havia sido encerrada”.
Maria Letícia foi rebatida por Denian Couto (Podemos), único vereador favorável à cassação de Freitas que se manifestou antes da votação. “Sou membro do Conselho de Ética, analisei cada prova e ouvi todas as testemunhas e não tenho dúvida de que estamos diante de um caso de quebra de decoro parlamentar. Houve rompimento da linha básica de como um vereador deve se comportar, e as imagens são claras. As manifestações que ouvi antes são a tentativa de criar uma narrativa de que essa Câmara estaria perseguindo um jovem vereador negro. É uma estratégia de criar um fato falso para se justificar o injustificável”. (Gazeta do Povo)